
sancionar a Lei do Combustível do Futuro
Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República via AFP
Por Nayara Machado
Como maior produtor mundial de cana-de-açúcar, o Brasil encontra na rota do etanol uma vantagem competitiva na produção de combustíveis sustentáveis para a aviação (SAF, em inglês), mostra um relatório lançado na última semana pelo Ministério da Fazenda e o Instituto AYA.
O levantamento aponta que o SAF de etanol (cuja rota de produção é conhecida como ATJ) tem potencial teórico para gerar até 6,5 bilhões de litros por ano na próxima década, representando 23% do potencial de produção estimado do país.
Já o etanol de milho vem logo atrás, com 5,5 bilhões de litros, ou 20% da capacidade projetada.
Juntos, superam as estimativas para aproveitamento dos óleos de palma e soja pela rota HEFA – a única com produção em escala atualmente –, cujo potencial é calculado em 20% e 17%, respectivamente.
O óleo de macaúba, palmeira nativa que vem sendo estudada como alternativa pela Acelen, poderia responder por 11% da produção, enquanto resíduos de madeira e outros representam os 10% restantes.
O estudo (.pdf) elaborado em parceria com a Systemiq o UK PACT e cerca de 200 organizações da sociedade civil e setor produtivo elencou o SAF como a atividade econômica com maior aptidão para incrementar o PIB brasileiro no cenário de transição energética.
A iniciativa quantificou a oportunidade para o crescimento do PIB entre US$ 230 e 430 bilhões até 2030 por meio de sete setores-chave da economia: transição energética, indústria e mobilidade, bioeconomia e biotecnologia, agropecuária e sistemas alimentares sustentáveis, nova infraestrutura verde e adaptação, economia circular e finanças sustentáveis.
Na transição (US$ 40 a 75 bilhões), o SAF poderia contribuir com US$ 17 a 36 bilhões até 2030. O valor, no entanto, é ligeiramente menor do que o estimado em um estudo de 2023, que previa uma contribuição de US$ 22-44 bilhões. A revisão incluiu biobunker nas contas (US$ 3-6 bilhões em potencial) e atualizações nos valores dos setores de indústria e mobilidade, onde cresceu a participação da eletrificação.
Instruções de voo
A metodologia para a priorização das cadeias de valor na análise foi fundamentada em sete critérios: competitividade global, complexidade econômica, potencial de geração de PIB, demanda internacional, potencial de descarbonização, estágio de desenvolvimento tecnológico e econômico e condições habilitadoras.
O SAF se sai bem em quase todos os requisitos. Os gargalos estariam na complexidade da cadeia de valor e condições habilitadoras, isto é, regulações, incentivos fiscais e outros mecanismos de incentivo.
Embora parta do princípio que pacotes econômicos aprovados nos últimos anos, como a Lei de Redução da Inflação nos EUA (IRA, em inglês) e o Green Deal europeu, além de políticas de carbono como os CBAMs e o Artigo 6.4 devem influenciar estruturação de cadeias de valor locais, regionais e globais – o relatório indica três fatores que serão decisivos para o biorrefino decolar no Brasil.
O primeiro deles diz respeito ao debate alimento versus energia. O documento aponta que é preciso alinhar diplomacia climática e regulação internacional para que os biocombustíveis de origem agrícola sejam aceitos em diferentes mercados.
“O debate de food vs. fuel vs. forests precisa avançar globalmente, com a compreensão dos órgãos reguladores europeus das particularidades de países como o Brasil, que tem a área equivalente à França só de áreas degradadas onde a produção poderia acontecer sem competir com alimentos e florestas”, explica.
Medidas fiscais e regulação doméstica são os outros dois fatores. O trabalho traz o exemplo dos EUA, que fornece crédito de US$ 1,25 para cada galão de querosene com SAF que atenda ao critério de redução mínima de 50% nas emissões de gases de efeito estufa do ciclo de vida. E cita o mandato da União Europeia para participação mínima de SAF na composição de combustível de aviação de 2% em 2025, 6% em 2030, chegando a 70% em 2050.
“O PL do Combustível do Futuro impõe 4% em 2030 e 12% em 2035. Vale notar que essa regulação brasileira, embora bem-vinda, ainda representa apenas uma pequena parcela (4-5%) do volume potencial da produção nacional (de 2030 a 2035)”, observa.
Fonte: Eixos