À exceção da Petrobras, o ano de 2023 terminou sem reforma no setor energético brasileiro. A inserção do Brasil no comércio e na geopolítica energética deve ser prioridade nas próximas décadas. Esta é a opinião de Luís Eduardo Duque Dutra, doutor em Ciências Econômicas pela Universidade de Paris-Nord e professor Adjunto da Escola de Química da UFRJ em artigo recente publicado no jornal Valor Econômico O especialista ressalta que, após uma década de completo desmonte do segmento, faltam planejamento, regulação e políticas públicas dedicadas ao tema.
A privatização do setor teve inicio no governo Collor, avançou com Fernando Henrique Cardoso, foi reformulada sem sucesso pelo PT e acabou retomada por Michel Temer e Jair Bolsonaro. Como resultado, verificou-se o aumento de tributos de nações importadoras, custos sociais e ambientais crescentes e nenhuma transparência na partilha da renda. Neste sentido, Dutra observa que o importante é a riqueza gerada pela energia.
No Brasil, o valor adicionado pela eletricidade, gás, óleo e biocombustíveis responde por um quinto do PIB. Entretanto, as famílias brasileiras, como consumidores, não se beneficiam de ganho significativo.
“No Rio de Janeiro, um quarto da tarifa elétrica residencial paga encargos e tributos. No gás natural, o carioca paga três vezes a remuneração do produtor e transportador, enquanto encargos e tributos somam um terço da conta. Nos combustíveis líquidos, um terço do preço da gasolina e um sexto do diesel são taxas e impostos, enquanto o ICMS sobre eles é a maior fonte de arrecadação estadual”, afirma o Dutra.
Para o professor da URFJ, a reforma na área de energia inclui mudanças profundas como revisar a desintegração dos ativos constituintes das cadeias energéticas, o ingresso de capitais aventureiros e especuladores, assim como a aposta na competição em indústrias de rede; um disparate à noção de monopólio natural. Só nos últimos dez anos, descontada a inflação, o preço da eletricidade subiu mais de 50%.
“Mas nem esse preço reflete o valor do bem, em razão do oligopólio e de atributos que o mercado ‘falha’ em reconhecer. A segurança energética, a dependência externa de derivados e gás, a volatilidade internacional e o custo ambiental não estão nos preços”, explicou Dutra. Ele destacou que o Estado perdeu os meios para atuar no setor: “Sem concursos, prestígio e com salários defasados, ele se reduziu ao mínimo. Autarquias e empresas do MME padecem de obsolescência prematura. Até hoje, os quadros dirigentes não foram renovados, a ideologia livre-cambista persiste e não se articula com quem importa, a Petrobras e o BNDES.”
Para o especialista, existe consenso quanto às fontes renováveis, à eletrificação dos processos, à renda petrolífera que deve bancar a transformação, à modicidade dos preços da energia num país entre os mais desiguais do mundo. “Mas o que dizer da Margem Equatorial? Do O&G não convencionais? Da energia nuclear na geração elétrica? Dos biocombustíveis de segunda geração? E do preço do gás como matéria-prima, para reconstruir a química brasileira?”, questionou.
Fonte Original: Valor Econômico