Ano começa amargo para biodiesel e etanol

Presidente Lula (PT) durante visita à feira Liderança Verde Brasil Expo e cerimônia de
sanção da lei do Combustível do Futuro -
Foto: Ricardo Stuckert/PR

Por Nayara Machado

Depois de um 2024 marcado por vitórias no Congresso Nacional e no Executivo, produtores de biodiesel e etanol voltam do Carnaval para um 2025 que promete ser conturbado em meio à expectativa de avanços nas misturas com diesel e gasolina versus o desafio de combater fraudes no mercado doméstico e disputas tarifárias com os Estados Unidos de Donald Trump.

Com veículos a gasolina e diesel emitindo cerca de 223,8 milhões de toneladas de CO2 — 44% dos gases de efeito estufa emitidos em energia e processos industriais em 2023 –, retrocessos nas políticas de biocombustíveis também são uma ameaça à ambição climática nacional.

Drama do biodiesel

Começou em fevereiro, quando o governo decidiu adiar o cronograma de aumento da mistura de biodiesel, que deveria passar de 14% para 15% em 1º de março. Entre os motivos está a preocupação com a inflação dos óleos vegetais – matéria-prima para o biodiesel –, e do próprio diesel, além do aumento de fraudes na formulação da mistura pelos distribuidores.

O crescimento de fraudes na mistura obrigatória de 14% de biodiesel ao diesel motivou o Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis e de Lubrificantes (Sindicom) a pedir à ANP, na quarta (12/3), uma pausa de até 90 dias no mandato.

A entidade alega irregularidades em 46% dos testes, com destaque para estados como SP, BA e MG, que são grandes consumidores. Também na quarta, o deputado federal Marcos Pollon (PL/MS) apresentou um projeto de lei para permitir que postos de combustíveis comercializem gasolina e diesel sem a adição de biocombustíveis.

Em outra frente, associações do setor de importação e distribuição de combustíveis estão pressionando pela regulamentação da importação de biodiesel no Brasil, sob o argumento de ampliação da concorrência e redução dos preços do produto no mercado interno. Em nota, Abicom (importação), Brasilcom, Fecombustíveis, IBP e SindTRR pedem que o CNPE reavalie a decisão de prorrogar o grupo de trabalho sobre o tema. Embora as justificativas variem – combate às fraudes, maior liberdade de escolha e competitividade –, todas as medidas têm em comum o impacto na produção nacional do biocombustível.

Dói no agro

“Qualquer mobilização ardil e pouco transparente para eliminar as energias renováveis do país deve ser entendida como uma afronta ao Congresso Nacional, responsável aprovar de forma unânime a Lei do Combustível do Futuro”, diz uma nota assinada pelas Frentes Parlamentares do Biodiesel (FPBio) e da Agropecuária (FPA), em reação ao pedido do Sindicom.

A FPA estima que 10 milhões de toneladas de soja deixarão de ser esmagadas com a suspensão do mandato, representando 8 milhões de toneladas a menos de farelo, base da alimentação de animais de corte. Ou seja, vai encarecer a carne.

Procuradas pela agência eixos, associações dos produtores de biodiesel reencaminharam a nota assinada pelas frentes parlamentares. Além da discussão do aumento da mistura para 15%, o movimento das distribuidoras vem na esteira da regulamentação da lei 15.802/2024.

O governo está finalizando um decreto que dará mais poder para a ANP fiscalizar o mercado. Distribuidoras que não cumprirem com obrigações regulatórias, como a adição de biodiesel, deverão ter as atividades suspensas.

“Espera-se que o decreto regulamentador apresente soluções efetivas para os desafios atuais, visando reduzir os prejuízos na cadeia de combustíveis e, ao mesmo tempo, impulsionar o mercado de biocombustíveis de forma sustentável e regulada”, comenta Julia Barbosa, advogada do escritório Gaia, Silva e Gaede.

Efeito Trump no etanol

Enquanto isso, no setor de etanol, usineiros aguardam a apresentação dos estudos para a elevação da mistura obrigatória de anidro na gasolina comum (marcada para 17/3, em Brasília) alertas aos possíveis impactos da disputa comercial entre Brasil e Estados Unidos em relação ao biocombustível.

Enquanto os EUA reivindicam uma redução na tarifa de 18% imposta pelo Brasil ao etanol importado, o governo brasileiro sugere a negociação de tarifas sobre o açúcar como contrapartida. Os EUA protegem o mercado com uma taxa sobre o açúcar brasileiro na casa dos 80%. A reciprocidade é norma nas relações comerciais, mas Donald Trump não está nem aí para as normas. Para a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) é um retrocesso no combate às mudanças climáticas.

“A medida pretende colocar no mesmo patamar o etanol produzido no Brasil e nos Estados Unidos, embora possuam atributos ambientais e potencial de descarbonização diferentes, e portanto não faz sentido falar em reciprocidade”, disse a entidade em nota enviada à agência eixos. Mas tem uma questão econômica que fala alto também: a concorrência entre os produtos derivados do milho.

Fonte: Eixos