Por Fernanda Pressinott
O trigo é um cereal sensível, e qualquer chuva ou seca em período crítico pode quebrar a produção ou afetar sua qualidade. Depois de décadas sofrendo com essa constatação, que muitas vezes o levou a prejuízos, um dos maiores produtores gaúchos resolveu a questão. Cassio Bonotto decidiu construir a maior usina de etanol de trigo do Rio Grande do Sul.
Com investimentos de R$ 110 milhões — R$ 75 milhões em recursos próprios e financiados — e R$ 35 milhões por meio de incentivo fiscal, a CB Bioenergia entrará em operação em dezembro no município gaúcho de Santiago. A planta tem capacidade de processar 30 mil toneladas de trigo ao ano, 25% da média de produção de Bonotto a cada safra.
“O trigo que não é classificado como perfeito para produção de farinha para pães, perde 30% do valor e somos obrigados a exportá-lo para o uso em ração de animais. É um prejuízo”, afirma Bonotto.
“Há uns dez anos, vi que no Centro-Oeste fizeram usinas de etanol de milho para usar o excesso de produção, pensei em fazer o mesmo com o meu próprio trigo e pus em prática”, conta.
Trajetória
Neto de imigrantes italianos e filho de um agricultor de Santiago, Bonotto começou sua própria produção em 1993, em 80 hectares. Hoje, cultiva 53 mil hectares de soja na safra de verão e 42 mil hectares de trigo no inverno, em uma área que atinge sete municípios.
“Aqui na região, a gente tem um ditado, é ruim plantar trigo, mas pior é não plantar. Com essa sensibilidade ao clima, entre 20% e 25% do trigo gaúcho fica ruim para os moinhos em toda a safra”, afirma o produtor.
Ele colhe em média 120 mil toneladas de trigo por safra e pretende continuar a fornecer 75% desse total para os moinhos. O que for classificado com PH abaixo de 78 quilos será destinado à usina de etanol. PH ou peso do hectolitro é a massa de 100 litros de trigo expressa em quilos. Essa medida envolve a avaliação de várias características do grão, tais como a sua forma, tamanho, peso e características externas, como a presença de palha, terra e outras impurezas.
O projeto da CB Bioenergia, que tem metas ambiciosas, prevê que 50% do trigo processado torne-se etanol hidratado para aviação agrícola, 25% vire álcool de cereais para as indústrias de cosméticos e alimentícia e 25% seja envasado como álcool gel. A capacidade de produção da unidade é de 13 milhões de litros de etanol anuais.
“Inicialmente, a ideia era fazer apenas etanol para aviação, porque 50% da frota do Estado usa esse combustível e tudo é importado de outras regiões, mas os estudos mostraram que o álcool de cereais remunera muito mais”, relata o empresário.
No processo de fermentação do trigo, a usina ainda produzirá CO2, que será engarrafado em cilindros e comercializado com indústrias de solda para metalúrgicas e de refrigerantes. A expectativa é que chegue a 20 mil metros cúbicos ao dia.
DDG
O processamento também vai gerar como coproduto do etanol o DDG (grão seco de destilaria). Esse farelo com teor proteico de 35% é bastante valorizado como ingrediente da ração animal nos mercados interno e externo.
Econômico nos detalhes, Bonotto afirma que já tem contratos prévios negociados para a venda de todos os tipos de etanol fabricados, CO2 e DDG.
Os planos futuros da empresa incluem ainda vender o DDG para produção de proteína hidrolisada (usada em suplementos alimentares como whey protein).
“As usinas de etanol grandes ganham centavos por litro produzido. A minha, como é pequena, precisa agregar reais por litro para ser rentável”, argumenta.
Segundo Bonotto, a unidade pode processar além de trigo, qualquer cereal que tenha amido como arroz e triticale. Só é necessário mudar a enzima que quebra as moléculas, acrescenta.
Além da CB Bionergia, outras empresas têm investido em etanol de trigo no Rio Grande do Sul. A Be8 constrói unidade em Passo Fundo e a FZ Bioenergia, em Viadutos. Ainda no papel, estão projetos da Timbro Trading, do grupo Canex e da Nexus.
Fonte: Globo Rural