Pesquisa brasileira identifica nova espécie de cigarrinha que ameaça a cana-de-açúcar

Lavoura de cana – Foto: Saulo Coelho Nunes/Embrapa Tabuleiros Costeiros

A pressão de pragas sobre a cana-de-açúcar — um dos pilares do agro brasileiro — acaba de ganhar um capítulo importante. Pesquisadores da Unesp de Rio Claro e da PUC-RS confirmaram a existência de uma nova espécie de cigarrinha-da-raiz, batizada de Mahanarva diakantha, após anos de suspeitas levantadas por produtores que relatavam perda de eficiência dos defensivos usados tradicionalmente no controle da praga.

Até então, dois insetos eram reconhecidos como responsáveis pelos danos mais severos às lavouras: M. fimbriolata e M. spectabilis. Ambas se alimentam da seiva da planta e liberam toxinas que reduzem a sacarose, queimam folhas e comprometem a produtividade. Mas os casos de falha no controle químico sugeriam que algo estava fora do padrão — e a suspeita, levantada por uma pesquisadora da Embrapa, tornou-se o ponto de partida para a descoberta da nova espécie.

As amostras coletadas em usinas entre 2012 e 2015, enviadas por empresas agrícolas preocupadas com a resistência crescente da praga, foram analisadas simultaneamente por duas frentes: a genética, conduzida por Diogo Cabral-de-Mello, da Unesp, e a morfológica, conduzida pelos pesquisadores Andressa Paladini e Gervásio Silva Carvalho, da PUC-RS. A abordagem integrativa confirmou as diferenças suficientes para caracterizar uma espécie inédita.

Do ponto de vista genético, Cabral-de-Mello identificou variações expressivas em um marcador mitocondrial usado para diferenciar espécies próximas. “Em uma das espécies, esse marcador genético apresenta um padrão conhecido que é conservado. No caso de espécies diferentes, o marcador sofre variações maiores”, explica o docente. Entretanto, como os insetos formam um grupo muito diverso, só a genética não bastava. A análise morfológica solucionou o enigma.

Paladini detectou uma diferença chave na genitália dos machos: enquanto espécies já conhecidas apresentam estrutura quadrangular, a nova cigarrinha possui uma formação bifurcada e pontiaguda, característica que inspirou o nome diakantha, que significa “dois espinhos”. Essa distinção, discreta, mas taxonomicamente marcante, confirmou o achado.

A descoberta tem consequências diretas para a produção de cana. Se diferentes espécies coexistem, produtos eficientes para uma podem falhar contra outra, exatamente como ocorreu nos relatos iniciais. Com isso, protocolos de manejo integrado terão de ser revisados, e novas formulações de inseticidas e estratégias biológicas poderão ser necessárias para enfrentar a M. diakantha.

“Mesmo que as espécies sejam próximas, um produto pode ser eficaz contra uma praga, mas não contra outra. Aparentemente era isso que estava sendo observado nas usinas”, afirma Cabral-de-Mello, reforçando que a identificação correta é o primeiro passo para um manejo eficiente.

Para o setor sucroenergético, que movimenta bilhões de reais e sustenta cadeias industriais do etanol ao açúcar refinado, a notícia acende um alerta, mas também abre caminho para soluções mais precisas. A partir de agora, a nova cigarrinha passa a fazer parte do mapa fitossanitário nacional — e o desafio será desenvolver tecnologias de detecção, controle e prevenção para impedir que a praga reduza ainda mais a competitividade das lavouras brasileiras.

Fonte: Agro Revenda