O que a SLC ensina sobre as dores e as delícias dos biológicos on-farm

Por Tatiana Freitas e Luiz Henrique Mendes

Depois de uma certa euforia nos últimos anos, com dezenas de biofábricas sendo montadas nas fazendas — e chegando até a ameaçar a indústria tradicional de defensivos agrícolas —, o mercado de biológicos on-farm dá sinais de enfraquecimento.

Multiplicar bactérias e fungos dentro das propiredades tem se revelado mais difícil do que o inicialmente esperado, levando algumas empresas a reavaliar sua estratégia para aumentar o uso de insumos biológicos. Em vez de depender da produção on-farm, mais barata porém mais exigente em processos, alguns grupos estudam elevar a participação de biológicos de prateleira.

Esse é o caso da SLC, um dos maiores grupos agrícolas do País (e do mundo). Recentemente, a empresa enfrentou alguns problemas de qualidade na produção de biológicos on-farm realizada em parceria com a SoluBio, fabricante de biológicos controlada pelo Aqua Capital, a firma de private equity de Sebastian Popik.

A SLC possui 15 biofábricas em suas fazendas, das quais 12 foram instaladas pela SoluBio e as outras três pela potigar TopBio. Depois dos problemas de qualidade enfrentados em algumas unidades, a SLC contratou uma consultoria para avaliar eventuais falhas.

Sob o comando de Leonardo Celini, diretor de operações, a companhia da família Logemann reavalia o caminho a ser adotado para continuar substituindo produtos químicos por biológicos no manejo das lavouras.

Neste momento, discute a renovação do seu contrato com a SoluBio, que vence este ano. Ao mesmo tempo, a SLC tem feito visitas a algumas das principais indústrias de biológicos do País para conhecer melhor os produtos e processos.

“A indústria de biológicos está se desenvolvendo muito rapidamente em termos de capacidade, qualidade do produto e shelf life,” disse Pavinato. “A produção on-farm artesanal vai perder espaço”, acrescentou, diferenciando o modelo estruturado de companhias como a Solubio da multiplicação de bactérias em caixas d’água, uma prática em propriedades rurais menos estruturadas.

O caso da SoluBio

Com mais de R$ 180 milhões em vendas anuais, a SoluBio lidera o mercado de biológicos on-farm com o desenvolvimento de tecnologias patenteadas — o que inclui um modelo de biofábrica que é instalado nas fazendas dos clientes —, mas sofreu um baque com um acúmulo de estoques e os atrasos que atingiram boa parte dos fabricantes de insumos agrícolas no Brasil.

A piora dos resultados foi tamanha que a SoluBio viu a margem Ebitda evaporar no ano passado, saindo de 69,6% em 2022 para 1,7%, mostrou um relatório do gestora carioca JGP, que investiu nos CRAs da companhia. Para evitar o estrangulamento financeiro, a SoluBio negociou e conseguiu o waiver dos credores para evitar o vencimento antecipado das dívidas.

De acordo com uma fonte, a queda das margens da SoluBio ocorreu por uma decisão estratégica, preservando o crescimento do negócio. No início do ano passado, a companhia optou por preservar as despesas (com vendas, inclusive), acreditando que as vendas poderiam crescer 50% a 60%. “A SoluBio cresceu 20%, o que derrubou a margem Ebitda”, argumentou a mesma pessoa. Com isso, foi mais difícil diluir custos.

Com os resultados mais pressionados e um nível de estoques que machucava o capital de giro, o Aqua Capital assumiu o controle da companhia, injetando capital na empresa e deflagrando uma ampla reestruturação que inclui a nomeação de Sheilla Albuquerque, ex-AgroGalaxy e Dow AgroScience, como CEO. Carlos Landerdahl, um executivo que fez carreira na Syngenta e passou os últimos seis anos na Ubyfol, foi recrutado como vice-presidente comercial e de vendas.

Os novos executivos da SoluBio reconhecem que algumas evoluções precisaram ser feitas para endereçar questões de qualidade apontadas pelos clientes, o que inclui a presença resíduos de bactérias e o processo de sanitização das biofábricas após a fabricação dos lotes de biológicos específicos.

Curva de aprendizagem

A biológica Rose Monnerat, uma expert da Embrapa que foi recrutada para liderar o P&D da SoluBio há dois anos, argumenta que o negócio de biológicos on-farm ainda é muito novo e que há uma curva de aprendizagem natural, aprimorando processos e corrigindo falhas que apareçam pelo caminho. A empresa planeja lançar em breve um biológico com um prazo de vencimento estendido, de alguns dias para no mínimo 21.

Na SLC, o uso do cloreto de ferro para fazer a limpeza da água usada na multiplicação dos microrganismos se mostrou uma falha de protocolo, provocando o encrustramento de substâncias nas biofábricas. Após a detecção da falha, a SoluBio revisou o protocolo e fez a limpeza das unidades, solucionando o problema. Situações como essa, no entanto, sempre causam algum stress.

Para Landerdahl, os desafios do mercado de biológicos on-farm são pequenos diante das oportunidades para desenvolver essa indústria, com benefícios que incluem a redução de pegada de carbono na agricultura.

Mesmo com os desafios, a parte boa é que o negócio vem crescendo ao mesmo tempo em que consegue reter clientes, disse Landerdahl. Segundo ele, o índice de perda de contratos (churn) da Solubio é inferior a 2%.

O modelo de contrato de longo prazo da companhia é outra prova do sucesso, ressaltou o vice-presidente. Os clientes típicos da SoluBio — agricultores ou companhias com área plantada acima de 5 mil hectares — aceitam firmar contratos de take or pay de no mínimo cinco anos.

“O produtor é um bicho sabido. Não é fácil ele fechar um contrato desses”, ressaltou. Atualmente, a Solubio conta com mais de 400 clientes.

Regulamentação

Enquanto isso, biológicos on-farm também enfrentam desafios regulatórios. O Congresso Nacional está debatendo um marco civil para o setor de biológicos por meio do projeto de lei 3668/2021, de autoria do senador Jaques Wagner (PT-BA). A legislação pode dificultar a produção de biológicos nas fazendas.

“Precisamos discutir os meios de produção e regulamentá-los para garantir a segurança do solo, do meio ambiente e dos produtos agrícolas”, disse Auro Ruschel, diretor jurídico da Abinbio (Associação Brasileira das Indústrias de Insumos Biológicos).

Embora existam empresas especializadas na instalação das biofábricas nas fazendas, no fornecimento de matérias-primas e em auxiliar os agricultores no controle de qualidade, como SoluBio e TopBio, a maioria da produção de biológicos on-farm é artesanal, representando um risco que os legisladores tendem a reduzir com a nova regulamentação. “O mercado de biológicos on-farm esfriou porque a produção deixou de ser eficiente. Depois da terceira safra, o agricultor desiste dela,” disse Ruschel.

Fonte: The AgriBiz