ITA 2.0? Novo complexo de R$ 3 bilhões com 540 hectares e centro de pesquisa vai produzir 50 aviões por ano, incluindo modelo de luxo e bimotor a etanol

Projeto da pista e infraestrutura logística do AeroCITI em Guaíba, com integração
rodoviária, fluvial e aérea para aviação executiva – Imagem: Aeromot Projeto

Novo polo aeronáutico no Rio Grande do Sul promete transformar Guaíba em referência da aviação leve, unindo indústria, pesquisa e inovação em um projeto que prevê aviões de luxo e o primeiro bimotor a etanol do mundo. O Rio Grande do Sul receberá um novo polo aeronáutico.

A Aeromot lançou em Guaíba o AeroCITI, um complexo industrial e de pesquisa que prevê produzir 50 aeronaves por ano até 2032, iniciar a montagem do Diamond DA62 em 2027 e, em paralelo, desenvolver um bimotor de transporte movido a etanol em parceria com a Finep. A empresa afirma que a fabricação local reduzirá o prazo de entrega do DA62 de aproximadamente 27 para 9 meses quando a fábrica estiver em operação.

Fábrica começa pelo DA62 e mira Mercosul

A produção no país começará pelo DA62, um bimotor de sete lugares que a Diamond chama de “ultimate flying machine”, voltado a deslocamentos corporativos e familiares de médio alcance. A Aeromot, representante exclusiva da marca no Brasil desde 2016, já importou mais de cem unidades e agora transformará parte desse fluxo em fabricação sob licença para atender o Brasil e os países do Mercosul.

Segundo a companhia, a linha de montagem inicia em 2027; as primeiras entregas estão previstas para 2028. Em entrevista recente, o CEO Guilherme Cunha disse que a capacidade global atual da Diamond é limitada, e que a estratégia é transferir tecnologia para uma base sul-americana. “Hoje, a Diamond tem uma capacidade produtiva limitada. A gente trabalhou em uma estratégia de transferência de tecnologia para uma base aqui na América do Sul suportar todos esses países”, afirmou.

Complexo industrial e centro de P&D em Guaíba

O AeroCITI foi concebido como uma aerotrópole sustentável, com pista prevista de 1.800 metros, áreas industriais, centro de inovação e facilidades logísticas. A implantação ocorrerá por fases, em uma área total informada pelo governo e pela empresa como superior a 500 hectares, com possibilidade de operar como aeródromo alternativo em contingências do Salgado Filho.

A Assembleia Legislativa aprovou a doação, com encargos, de área pública, e a prefeitura concedeu incentivos locais para viabilizar o empreendimento. Além das fábricas e do hub tecnológico, o plano inclui um Museu do Avião a céu aberto com cerca de 24 mil m², trilhas de caminhada e espaços de lazer integrados ao parque industrial.

A Aeromot aponta que o desenho urbano busca atrair empresas de manutenção, formação e logística, ampliando a cadeia de valor da aviação geral na Região Metropolitana de Porto Alegre.

Investimento escalonado e empregos

A estimativa total de R$ 3 bilhões soma recursos da Aeromot e de empresas parceiras, com fases de obras e aquisição de equipamentos até a consolidação da capacidade plena. Em comunicados públicos, a empresa e órgãos estaduais mencionam a criação de cerca de 1,5 mil empregos diretos ao longo da implantação. A primeira etapa engloba terraplanagem, infraestrutura básica e instalação das unidades iniciais de manufatura.

Mercado-alvo e renovação da frota executiva

O público comprador do DA62 no Brasil é majoritariamente corporativo, com uso para viagens de trabalho e deslocamentos regionais. A Aeromot avalia que a produção nacional deve facilitar financiamentos locais, o que tende a ampliar a demanda num mercado que hoje realiza cerca de 90% das vendas à vista, segundo a empresa.

O movimento ocorre em um contexto de forte demanda por jatos e turbo-hélices executivos e de envelhecimento da frota latino-americana. O Brasil figura atualmente como o segundo maior país em número de jatos executivos, atrás apenas dos Estados Unidos, o que indica potencial de renovação do parque aeronáutico.

Conteúdo local cresce por etapas até 2032

O plano industrial prevê montagem inicial com componentes importados e aumento gradual do conteúdo local até 2032, quando a linha de produção completa deverá estar instalada. Para acelerar integração tecnológica e formação de mão de obra, a Aeromot cita parcerias com universidades e centros de pesquisa como UFMG, UFRGS, PUC-RS, Unicamp (Instituto BI0S) e o Parque Tecnológico de São José dos Campos.

O cronograma inclui ainda o anúncio de uma segunda parceria industrial a ser formalizada na cerimônia da pedra fundamental, realizada neste 23 de outubro.

Projeto de bimotor a etanol mira descarbonização

Em paralelo à fábrica, a empresa coordena um projeto de avião bimotor de transporte movido a etanol, desenvolvido com apoio da Finep. O objetivo declarado é lançar, em cerca de cinco anos, um modelo certificado para passageiros que utilize etanol como principal combustível — solução já comum na aviação agrícola, mas inédita para transporte de pessoas nessa configuração, segundo a Aeromot.

A iniciativa se alinha à agenda de descarbonização do setor para as próximas décadas, que combina biocombustíveis, SAF e novas arquiteturas de propulsão. 

Diamond: origem austríaca e controle chinês

A Diamond Aircraft foi fundada na Áustria e possui operações no Canadá. Desde 2017, está sob controle da Wanfeng Aviation, ligada ao grupo chinês Wanfeng Auto Holding. O DA62 emprega motores Austro AE330 a querosene de aviação (jet fuel) e aviônica Garmin G1000 NXi, combinação que posiciona o modelo como uma alternativa de baixo consumo dentro do segmento dos bimotores a pistão de alta gama.

Infraestrutura e operação regional

De acordo com o projeto, o AeroCITI terá integração rodoviária e fluvial, reforçando a logística de recebimento de insumos e escoamento de aeronaves e componentes. A pista planejada de 1,8 km permite atender desde operações de testes e entregas até voos executivos regionais.

A ideia é que, em situações de contingência, o sítio possa apoiar a malha aérea metropolitana. A companhia também projeta produzir componentes para outras linhas da Diamond nas Américas, reforçando a matriz exportadora do complexo.

Prazo de entregas e carteira no país

Mesmo antes da produção local, a Aeromot relata mais de 100 DA62 já comercializados no Brasil, número que embasa a decisão de verticalizar a operação. Com a nacionalização parcial da cadeia, a empresa espera encurtar prazos e ampliar a capacidade para atender à região, reduzindo a fila global do modelo.

Com a pedra fundamental lançada e um cronograma que combina fábrica, P&D e atração de parceiros, a aposta do AeroCITI é reposicionar o Sul como endereço da aviação leve certificada no país. Na sua avaliação, esse plano tem fôlego para ganhar escala no Brasil e no Mercosul — o que você gostaria de ver como primeiro resultado concreto: entrega do DA62 nacional ou voo inaugural do bimotor a etanol?

Por Alisson Ficher

Fonte: Click Petróleo e Gás