Governo negocia aumento da cota de açúcar brasileiro nos EUA

Embarque de açúcar para exportação — Foto: Claudio Neves/Portos do Paraná


Por Rafael Walendorff e Estevão Taiar

O governo brasileiro colocou na mesa de negociação com os Estados Unidos a ampliação da cota de exportação de açúcar para lá. O pleito antigo do setor nacional, maior produtor mundial, ganhou força em Brasília como uma possível moeda de troca diante da pressão do presidente Donald Trump por redução na tarifa de 18% cobrada pelo Brasil para a entrada do etanol americano aqui.

Outras sugestões em análise são o aumento da cota para exportação de carne bovina e a abertura de mercado para o limão do Brasil. Os temas serão negociados em bloco, não por setor, e em nível de governos, disseram pessoas a par do assunto. As discussões envolvem ainda o possível tarifaço contra o aço e o alumínio brasileiros e são coordenadas pelo ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços e vice-presidente, Geraldo Alckmin.

Atualmente, a cota preferencial de açúcar para acesso ao mercado americano pelo Brasil é de 146,6 mil toneladas isentas de impostos. Está dividida entre 39 empresas do Nordeste do país. Há alguns anos, o governo tenta ampliar essa quantidade para algo em torno de 300 mil e 400 mil toneladas, mas enfrenta resistências. Não há confirmação se o pedido foi mantido nesse patamar.

Em 2024, as exportações brasileiras para os Estados Unidos somaram 876,7 mil toneladas, com uma receita de quase US$ 440 milhões. Acima da cota, o produto é taxado em cerca de 80%. Produzido em 26 dos 50 Estados americanos, o açúcar é considerado um produto “superprotegido” e de difícil negociação por pessoas que acompanham o assunto em Brasília. Os negócios são considerados irrisórios por fontes da indústria, em comparação com os embarques totais de mais de 33,4 milhões de toneladas de açúcar do Brasil no ano passado, com faturamento de US$ 15,9 bilhões.

A avaliação dos técnicos do governo é que o açúcar tem relação direta com o etanol, produto para o qual os americanos querem mais espaço no Brasil, o que pode justificar o atendimento ao pedido desta vez. “Etanol e açúcar para o Brasil são indissociáveis”, disse uma fonte. Isso porque a maior parte do biocombustível brasileiro é produzido a partir da cana-de-açúcar. Nos Estados Unidos, porém, o etanol é feito de milho, o que baliza argumentos do outro lado da mesa sobre efeitos em indústrias diferentes no caso da ampliação da cota.

O assunto já foi tratado na videoconferência do vice-presidente Geraldo Alckmin com o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick. Na ocasião, o governo brasileiro propôs a criação de um grupo de trabalho para tratar das relações comerciais entre os dois países.

“A estratégia é tentar ter alguma moeda de troca na questão do etanol caso se encaminhe para ter uma redução de tarifa do lado brasileiro”, disse uma fonte do governo. A conquista de mais espaço para o açúcar seria uma forma de “compensação”, avaliou.

Em entrevista nesta segunda-feira (10/3) à Rádio CBN, Alckmin citou o açúcar como um dos produtos brasileiros com taxação elevada pelos EUA, ao contrário do etanol. “Nos Estados Unidos, o imposto de importação [sobre etanol] é 2,5%. O nosso é 18%. É verdade. Só que no caso do açúcar eles têm uma pequena cota [de isenção para as exportações brasileiras], e o que passa dessa cota é [taxado] em 90% praticamente”, disse.

Não há definição de como será o processo. Uma das soluções pode ser negociar a abertura de uma cota isenta para o etanol americano em troca da ampliação da cota de açúcar, por exemplo. Um executivo do setor produtivo brasileiro lembrou que o tema “está no radar há muito tempo” e que dificilmente terá evolução. “É muito difícil de acontecer. Vai haver resistência do governo e Congresso dos EUA”, apontou.

A eventual ampliação da cota geraria uma “contrapartida” interessante às usinas do Nordeste, responsáveis por 10% da produção nacional, pois o item tem preços elevados nos EUA. A indústria sucroenergética do Centro-Sul não seria beneficiada diretamente, disse a fonte. Pela lei brasileira, as cotas devem ser preenchidas por empresas nordestinas do setor de cana-de-açúcar. Elas também são as principais afetadas pela importação de etanol americano, que entra pelos portos da região por conta da distância.

Há também uma avaliação no governo brasileiro de que o anúncio recente sobre a intenção de zerar a tarifa de importação de milho (de 7,2%), como forma de atacar a inflação de alimentos internamente, também atende ao interesse dos americanos, que pedem melhores condições para exportação do cereal para cá. Os EUA são o maior produtor mundial do grão, usado também na produção de etanol.

O governo também deve apresentar pedidos para a ampliação da cota de exportação de carne bovina. Há uma autorização para 65 mil toneladas anuais atualmente que o Brasil divide com outros nove países. Em 2024, a indústria frigorífica nacional foi responsável pelo embarque de 57 mil toneladas dentro da cota. As vendas totais aos americanos chegaram a 230 mil toneladas.

Em 2025, a quantidade isenta foi preenchida nos primeiros dias de janeiro. A expectativa é ampliar a cota para 150 mil toneladas, disse uma fonte familiarizada com as tratativas. Sobre o limão taiti produzido no Brasil, a pendência é a assinatura do protocolo fitossanitário para início da comercialização.

Fonte: Globo Rural