Fertilizantes encarecem e relação de troca piora para o produtor

Aplicação de fertilizante em lavoura brasileira – Foto: Wenderson Araujo/CNA

Após um início de ano marcado por forte ritmo de compras externas e entregas acima da média, o mercado brasileiro de fertilizantes deve desacelerar nos próximos meses. A avaliação é do analista da Consultoria Agro do Itaú BBA, Lucas Brunetti, que aponta uma combinação de fatores para justificar o possível esfriamento do setor no segundo semestre.

Entre janeiro e maio deste ano, o Brasil importou 14,4 milhões de toneladas de fertilizantes, volume 14% superior ao registrado no mesmo período de 2024. No entanto, segundo Brunetti, esse desempenho expressivo tende a não se repetir. “Muitas empresas aproveitaram os preços mais baixos praticados no início do ano para antecipar suas compras. Agora, com as cotações em patamares mais altos, o apetite deve diminuir”, afirma.

A perspectiva da consultoria é de que as importações totais em 2025 sejam 1,8% menores que no ano passado, somando 40,6 milhões de toneladas. A previsão contrasta com o desempenho do primeiro trimestre, quando também houve alta nas entregas aos produtores. Segundo dados da Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA), entre janeiro e março, as entregas somaram 9,6 milhões de toneladas, um avanço de 9,1% em relação ao mesmo intervalo do ano anterior.

Mesmo com esse resultado positivo no início do ciclo, Brunetti pondera que o ritmo não deve se manter. “Os preços seguem elevados e as relações de troca se deterioraram, o que impacta diretamente o poder de compra do produtor rural. Isso tende a moderar a demanda ao longo do ano”, pontua.

A expectativa do Itaú BBA é que as entregas totais de fertilizantes em 2025 cresçam cerca de 6%, alcançando 48,5 milhões de toneladas. A maior parte desse volume, no entanto, deve se concentrar no segundo semestre, período crítico para o planejamento e aplicação dos insumos destinados à safra de verão.

Estoques elevados pressionam margens de revendas

Outro elemento que contribui para a mudança no ritmo do mercado é o nível elevado de estoques, tanto na indústria quanto nas revendas. Desde 2021, o volume armazenado vem subindo e, no início de 2025, estava acima da média histórica. “Esse excedente ajuda a explicar a queda esperada nas importações mesmo com a projeção de aumento nas entregas”, observa Brunetti.

Enquanto os estoques permanecerem altos, a pressão sobre as margens do setor de distribuição deve continuar. O analista ressalta que, embora ainda haja necessidade de aquisição de fertilizantes para a safra de verão, o ambiente é de cautela. “Os preços seguem em patamares elevados e a expectativa de queda nos valores é de um ajuste lento, sem recuos abruptos”, aponta.

Além dos custos, as operações logísticas também exigem atenção. Com a concentração das entregas no segundo semestre, aumentam os riscos de gargalos nos portos e no transporte interno, o que pode comprometer a chegada dos produtos no momento ideal de aplicação. “Essa é uma janela sensível. Atrasos podem afetar diretamente a produtividade das lavouras”, alerta Brunetti.

Diante desse cenário, a análise da consultoria indica que o mercado de fertilizantes deve perder dinamismo gradualmente nos próximos meses, influenciado pelo alto nível de estoques, preços firmes, margens mais estreitas no campo e riscos logísticos. A expectativa, segundo Brunetti, é de um segundo semestre mais cauteloso e marcado por ajustes pontuais, à medida que o setor se adequa a um novo equilíbrio entre oferta, demanda e rentabilidade.

Preços sobem e devem permanecer altos, pressionando custo de produção

O mercado global de fertilizantes iniciou 2025 em forte tendência de alta. Todos os principais nutrientes – fosfatados, potássicos e nitrogenados – apresentaram valorização, sustentada por uma combinação de demanda firme, restrições de oferta e instabilidades geopolíticas.

O maior destaque foi o segmento de fosfatados. O preço do MAP (monoamônio fosfato) ultrapassou os US$ 700 por tonelada, com negócios pontuais no Brasil acima dos US$ 750/t. Segundo Brunetti, o preço mais recente do MAP CFR Brasil foi de US$ 765/t, representando uma alta de US$ 130/t no ano. “A principal causa para este aumento foi a ausência da China do mercado exportador por vários meses, aliada à crescente demanda da indústria de baterias pelas rochas fosfáticas”, expõe.

Além disso, o aumento no preço do enxofre, matéria-prima essencial para o MAP e cuja produção é fortemente concentrada no Oriente Médio, também contribuiu para a alta. Com a China voltando a embarcar o produto, há expectativa de algum alívio no médio prazo. “Apesar dos preços elevados, não há risco de falta de produto no curto prazo, desde que o comprador esteja disposto a pagar os valores de mercado”, salienta Brunetti.

Entre os nitrogenados, o cenário também é de pressão. A ureia, que foi cotada abaixo dos US$ 400/t durante boa parte do ano, chegou a ultrapassar os US$ 450/t durante o pico das tensões militares entre Israel e Irã. No auge do conflito, o fornecimento de gás natural do Oriente Médio, fundamental para a produção de ureia e amônia, foi interrompido, afetando especialmente as plantas no Egito.

Mesmo com a queda posterior dos preços do gás e a normalização da produção, os preços da ureia seguem acima dos US$ 490/t CFR Brasil, impulsionados pela forte demanda da Índia e pela insegurança na oferta global. “Hoje, o risco geopolítico tem se mostrado mais determinante nos preços dos nitrogenados do que os custos diretos de produção”, explica o analista, ressaltando que a região do Oriente Médio, responsável por cerca de 40% das exportações globais de ureia, continua sendo o ponto mais sensível da cadeia de suprimentos.

Já os fertilizantes potássicos registraram alta consistente, mesmo sem grandes rupturas de oferta. O KCl (cloreto de potássio) importado já atingiu US$ 360/t no Brasil, impulsionado por manutenção em minas na Rússia e Belarus e por acordos internacionais entre China e Índia que elevaram os pisos de preço. “O mercado potássico é dominado por grandes players globais que têm força para sustentar os preços, especialmente com a demanda aquecida em países como Brasil e Índia”, afirma Brunetti.

O preço do ácido fosfórico, utilizado na produção de fertilizantes fosfatados, também subiu, indicando pressão adicional ao longo da cadeia. A demanda firme em grandes consumidores e os aumentos sucessivos nos custos reforçam a expectativa de que os preços permanecerão altos no curto e médio prazos.

Tendência é de acomodação, mas câmbio pode reverter alívio

Apesar da escalada recente, a projeção da consultoria é de que o mercado caminhe para uma acomodação dos preços, ainda que em patamares elevados. O arrefecimento dos fatores de estresse na oferta, como o retorno gradual da China ao mercado e a estabilização da produção no Egito, deve conter novas altas expressivas.

Entretanto, o setor continua vulnerável a choques externos. “O histórico recente mostra que o mercado de fertilizantes responde muito rapidamente a riscos geopolíticos, como vimos em 2022 com a guerra na Ucrânia e agora com os conflitos no Oriente Médio”, alerta Brunetti.

Outro fator que pode elevar os custos no curto prazo é o câmbio. A desvalorização do real frente ao dólar encarece ainda mais os insumos importados. No caso dos fertilizantes, cujos preços já estão elevados, essa oscilação cambial pode piorar a relação de troca com as commodities agrícolas, especialmente em um cenário de margens mais apertadas para os produtores.

Diante desse panorama, a recomendação é de cautela. “O produtor precisa acompanhar de perto o comportamento do mercado e os prazos logísticos, pois atrasos podem comprometer a aplicação ideal dos insumos. Estratégias bem planejadas de compra e gestão de estoque serão fundamentais para manter a competitividade”, enfatiza Brunetti.

Fonte: O Presente Rural