Por Martinho Ono* e Alexandre Menézio**
Certamente, ao tema proposto nesta edição: “Brasil, é agora ou nunca mais”, se busca saber as expectativas que temos em relação à regulamentação e à implementação do RenovaBio e o comportamento do novo governo em relação à política de biocombustíveis. Abordarei, assim, assuntos que consideramos relevantes, diante do atual cenário e da nova dinâmica do setor, especialmente do etanol.
Nas reuniões de diretoria ou de conselho, é recorrente a pressão pela redução de custos, pela decisão de produzir etanol ou açúcar, o melhor momento de fixar o preço de açúcar e/ou comercializar o etanol. O mercado das commodities vem exigindo dos gestores a necessidade de estarem sempre atualizados com os movimentos que influenciam direta ou indiretamente nos preços das commodities que produzimos. A recente mudança na precificação dos combustíveis fósseis pela Petrobras alterou por completo a dinâmica de preços do etanol no mercado interno.
Antes, tínhamos um reajuste anual nos preços dos combustíveis fósseis, assim a nossa preocupação se resumia em avaliar o tamanho da safra, mix de produção e segurar volumes para comercializar na entressafra, invariavelmente com preços que remuneravam o custo financeiro do inventário com boa margem de lucro. Tudo mudou; atualmente, o preço da gasolina no Brasil acompanha as flutuações do mercado internacional, assim como as variações cambiais da nossa moeda.
O preço do petróleo, em particular, requer análise mais complexa, diante dos cenários imprevisíveis da geopolítica mundial, que envolvem os países membros da OPEP, as barreiras comerciais que estão sendo impostas entre os países e as restrições impostas contra o Irã, terceiro maior produtor de petróleo.
Habitualmente, a gasolina comercializada durante o verão da América do Norte e na Europa tem os preços maiores, no auge da safra do Centro-Sul, enquanto, em nossa entressafra, de dezembro a março, os preços normalmente cedem, em função de menor demanda sazonal.
A participação do etanol de milho com a crescente produção nacional ou com a importação também influencia diretamente na avaliação das ofertas, dos estoques e, consequentemente, nos preços do mercado interno. Torna-se imprescindível que estudos sobre arbitragem do etanol importado e a competitividade do etanol de milho sejam avaliados.
Portanto o carregamento de inventário para a entressafra pode comprometer os resultados, diante da incerteza de remunerar os elevados custos financeiros. Como sobreviver num mercado com essa complexidade? Como tomar decisões assertivas diante de tantas incertezas?
A necessidade de um departamento de inteligência ou a contratação de empresas especializadas, com reconhecida expertise, tornou-se imprescindível. Agora, nas reuniões de board ou nos comitês, as empresas devem analisar com maior amplitude os cenários e as variáveis que influenciam na demanda e nos preços dos nossos produtos. Compartilhar as decisões baseados em estudos, pesquisas e informações são requisitos relevantes para reduzir os riscos e obter melhores resultados da comercialização.
O tema da redução de custos é um chavão muito repetido, mas pouco compreendido, infelizmente. O senso comum nos impele a entender que gastar menos do que se ganha é bom para o resultado, e isso é uma verdade. A questão é que isso nem sempre é suficiente. E pode ficar pior, quando se atua no segmento das commodities.
Especificamente no setor canavieiro, muitas vezes a robustez dos resultados advém de uma estratégia bem executada de fixação de preços no momento adequado, no caso do açúcar, ou de construção de estoques e de administração da sazonalidade, no caso do etanol.
No lado do custo, por sua vez, o campo é amplo, e inúmeras oportunidades se apresentam, envolvendo redução ou postergação do desembolso de caixa via redução de preços, redução de estoques, substituição de insumos, renovação no painel de fornecedores, desintermediação da cadeia de abastecimento e outras.
Por que, então, sobram oportunidades não aproveitadas, enquanto empresas padecem por insolvência financeira e aumento do risco operacional e do custo de crédito? A resposta poderia ser ”por desconhecimento”, mas é mais provável que seja “por descrédito”: são poucos os sócios e executivos de empresas que admitem que seus times – agroindustriais, financeiros, de compras, não importa – possam não estar explorando todas as vias disponíveis de aumento da eficiência operacional ou comercial.
Afinal, é a responsabilidade deles. O fato, porém, é que mesmo empresas eficientes do ponto de vista operacional e com bons resultados devem explorar as inúmeras alavancas de eficiência em compras. Os efeitos positivos do aumento da escala. Talvez a mais importante das alavancas de eficiência seja o aumento da escala.
Cerca de 80% dos grupos empresariais no setor canavieiro processam menos de 5 milhões de toneladas de cana-de-açúcar anualmente. Ainda assim, boa parte desses grupos não considera explorar sinergias entre si no lado das compras, enquanto, no lado das vendas, competem no mesmo terreno, comercializando commodities. Não obstante, grupos multinacionais começaram a atuar no segmento, originando duas dezenas de grandes conglomerados através de sequências positivas de fusões, aquisições, greenfields ou crescimento orgânico. E, mais recentemente, empresas se uniram e formataram organizações de compra conjunta, dentro dos parâmetros legais estabelecidos pelo Direito Econômico.
O primeiro efeito observado desse agrupamento de empresas – formados com a finalidade específica de aquisição conjunta de insumos e serviços – é a equalização do poder de compra com os conglomerados já estabelecidos, com resultados muito positivos. Tais resultados advêm não somente da obtenção de preços mais baixos – afinal, fornecedores apresentam estratégias de precificação mais favoráveis aos grandes clientes, não importando muito o segmento de atuação – mas também da desintermediação da cadeia de abastecimento, pois grandes clientes são capazes de acessar fabricantes diretamente, ao invés de submeter-se obrigatoriamente às estruturas de revenda e de distribuição.
Os ganhos são certos e relevantes. Construídos sobre uma estrutura mais competitiva de preços de venda ou pela simples eliminação de tributos, ao se comprar diretamente do fabricante. Além disso, negócios com grandes clientes atraem fornecedores mais robustos e estimulam fornecedores mais criativos a apresentarem soluções inovadoras, que permitam redução de custos através de fatores que não necessariamente envolvam preço ou tributos, como a otimização de embalagens, a consignação de estoques, a adoção de tecnologia na administração do abastecimento e de estoques para produção, o investimento conjunto em melhorias no processo ou na estrutura operacional.
Não importa de onde venha, ganho sempre é bom. E, para isso, é essencial jogar de igual para igual com os grandes conglomerados, reduzindo custos e aumentando a competitividade, e, de outro lado, usar a inteligência de mercado para maximizar as receitas e aproveitar o timing certo para fixação e comercialização do açúcar e do etanol.
*Diretor da SCA Brasil/**Diretor de Compras da SCA Etanol
Artigo publicado originalmente na Revista Opiniões, edição de Outubro/Dezembro de 2018.