Crise de dividendos expõe tentativa de ingerência governamental na Petrobras

Jean Paul Prates: executivo negou rumores de que poderia deixar cargo e disse que
tema não entrou na pauta com Lula — Foto: Leo Pinheiro/Valor

Reportagem do Valor Econômico expõe um “jogo de xadrez” em curso sobre o pagamento de dividendos da Petrobras aos acionistas, referentes ao último trimestre de 2023. Na apuração do jornal, informações que circulam nos bastidores indicam que a decisão anunciada pela estatal na quinta-feira (7) de não distribuir remuneração extra aos investidores estaria sob risco de não ocorrer. Passou-se a considerar a possibilidade de um entendimento que leve os acionistas, em assembleia no dia 25 de abril, a analisarem a distribuição parcial ou total do dividendo extraordinário.

Esse movimento atingiu em cheio o valor das ações da petrolífera. Depois de bater o recorde de R$ 571,4 bilhões de valor de mercado em 19 de fevereiro, a Petrobras reverteu parte dos ganhos nos últimos dias. Daquela data até o fechamento de sexta-feira (8), a companhia havia perdido R$ 93,9 bilhões. Considerando o fechamento de ontem, a perda acumulada, desde 19 de fevereiro, subiu para R$ 100,5 bilhões.

Na semana passada, o colegiado da estatal frustrou os investidores ao decidir encaminhar sobras de lucros para uma reserva de capital em vez de repassar a quantia para os sócios da Petrobras, incluindo o próprio governo, que é o controlador da estatal e também se beneficia dos dividendos pagos. Os dividendos extraordinários aumentariam a arrecadação primária do governo federal entre R$ 6 bilhões e R$ 12 bilhões, afirmou ontem uma fonte da equipe econômica da União ao Valor. Os dividendos em questão dizem respeito ao quarto trimestre do ano passado.

A discussão sobre os dividendos da Petrobras vem desde a campanha eleitoral de 2022, quando Lula criticava a petroleira pelos montantes pagos aos acionistas, indicando que seria preciso reduzir os valores para que a empresa investisse mais. Executivos da indústria dizem que esse é um falso dilema, uma vez que para aumentar os investimentos é preciso ter em carteira projetos com taxa de retorno acima do custo de capital. Do contrário, se destrói valor da companhia, como aconteceu quando a Petrobras cresceu além de sua capacidade e acumulou a maior dívida corporativa do mundo.

Para os analistas consultados na reportagem, fica claro que o governo vê o pagamento dos dividendos como algo que “prejudica a capacidade da Petrobras em elevar os investimentos e crescer”. A destinação para essa reserva será pauta da Assembleia Geral Ordinária (AGO), no dia 25 de abril. Segundo a reportagem, a assembleia pode ratificar a proposta do conselho e direcionar os recursos para a reserva de capital ou optar pelo pagamento do dividendo extra.

De acordo com as fontes ouvidas, se a alternativa for pela destinação para a reserva, o dinheiro iria para o caixa geral da empresa e poderia vir a ser usado para investimentos, como quer o governo. A diretoria da Petrobras negou, na semana passada, que o dinheiro da reserva possa ser usado para investimentos. Teria finalidade específica: o pagamento de dividendos no futuro. Na assembleia, porém, pode haver discussões sobre o tema.

Fonte: Valor Econômico