A redução prevista das chuvas nos meses de março e abril e a chegada do La Niña no segundo semestre devem provocar uma queda de 64 milhões de toneladas, ou de 9,8%, na moagem de cana no Centro-Sul na próxima safra, a 2024/25, para 592 milhões de toneladas. O atual ciclo, que se encerra este mês, deve alcançar produção recorde de 656 milhões de toneladas de cana. A estimativa foi apresentada ontem pela consultoria Datagro em evento de abertura da safra em Ribeirão Preto (SP).
“A safra que está terminando é para ser guardada na memória. As chuvas de março e abril de 2023 fizeram o tamanho recorde da produção, e a falta de chuva no final permitiu o processamento de toda a cana. Além de chuvas adequadas, não houve geadas, o índice de incêndios foi baixo, a infestação de broca esteve sob controle e o produtor usou bom nível de tecnologia”, disse Plínio Nastari, presidente da Datagro, no evento.
Na avaliação de Nastari, os preços da safra 2023/24 foram bem remuneradores para o açúcar, mas o preço do etanol permaneceu sob pressão durante todo o período devido ao consumo baixo, que começou a se recuperar em agosto.
Segundo a consultoria, as exportações de açúcar devem fechar bem acima da média histórica, com 32,85 milhões de toneladas e um estoque de passagem de 3,28 milhões. E os preços do açúcar, bem mais remuneradores que os do etanol, indicam que a nova safra será também mais açucareira.
A Datagro estimou que a produção de açúcar deve recuar para 40,5 milhões de toneladas no novo ciclo que começa em abril. Na safra passada, foram 42,5 milhões de toneladas. Já a produção de etanol deve sair de 33,52 bilhões de litros para 30,4 bilhões de litros.
Previsão de chuvas 27% abaixo da média histórica nos próximos três meses — período fundamental para o desenvolvimento da cana —, além de precipitações menores e possibilidade de geadas em decorrência do La Niña explicam a estimativa de queda na moagem no novo ciclo.
Com esses fatores, a produtividade por hectare deve cair de 88,3 toneladas para 78,8 toneladas no Centro-Sul, num cenário de crescimento de apenas 1% na área de produção, devido à menor renovação dos canaviais.
Luciano Rodrigues, diretor de Inteligência Setorial da União da Indústria de Cana de Açúcar (Unica), concordou que a safra que se encerra trouxe surpresas. “A primeira foi a produção. Em fevereiro de 2023, a estimativa mais otimista falava de 600 milhões de toneladas e agora vamos passar de 650 milhões, um recorde histórico e [alta de] produtividade de mais 19%,” afirmou.
Outra surpresa, segundo ele, foi a disparidade entre as empresas que fazem etanol e as que fazem açúcar porque o preço dessa commodity cresceu 22%, e o do etanol caiu na mesma proporção. Na média, a receita subiu 4% em relação ao ciclo anterior.
Para o diretor da Unica, a competitividade do etanol foi prejudicada por mudanças tributárias no meio de 2022 que permaneceram por 12 meses, levando o consumidor a migrar para a gasolina. Além disso, afirmou, o produtor de etanol hoje tem desafios que vão além de estimar a safra. “O produtor tem que entender do mercado de grãos, de petróleo, estar antenado com as inovações tecnológicas, o mercado de CBios [créditos de descarbonização] e novas regulações. E vai ficar mais complexo com SAF [bioquerosene de aviação], combustível de navio e a competição com outros renováveis.”
José Sérgio Ferrari Junior, diretor da Usina Ferrari, de Pirassununga (SP), também espera uma moagem menor na nova safra. No ciclo 2023/24, a usina teve um recorde de 3,55 milhões de toneladas, com mix de 52% de açúcar.
“O viés é mesmo de baixa em relação à nova safra. É difícil calibrar um número, mas as previsões climáticas colocadas na mesa nos indicam menos períodos de chuva nos próximos meses”, disse ele, que esteve no evento da Datagro.
Ele afirmou que a Ferrari vai aumentar o mix de açúcar com o investimento que fez de R$ 20 milhões para aumentar a capacidade de produção, já que o preço do etanol se deteriorou. “Hoje, o litro do etanol rende para a usina
R$ 1,80 ou 1,90, já com os CBios, e o custo para produzir é de R$ 2”, afirmou. Para ele, o preço do açúcar não deve ser “tão bom” nos próximos anos porque muitas usinas também fizeram ampliações e porque quem não tinha fábrica de açúcar está montando uma.
Fonte: Globo Rural