Aumento dos preços internacionais dos fertilizantes e diminuição da produtividade deixam gestão dos produtores de cana no limite da sustentabilidade

Colheita mecanizada de cana-de-açúcar — Foto: Wenderson Araujo/CNA

Por Ericson Cunha

A safra 2025/26 já começou com um grande desafio: recuperar as perdas causadas pela estiagem e pelas queimadas do ciclo anterior. Embora o setor soubesse que uma produtividade robusta seria difícil, os impactos foram se tornando mais evidentes ao longo do ano e passaram a representar uma ameaça real à sustentabilidade da gestão dos produtores.

Segundo Raphael Delloiagono, analista de mercado do Pecege, a expectativa é de uma redução de cerca de 12% na safra. Esse cenário se agrava com a alta nos custos de produção, puxados especialmente pelo aumento dos preços internacionais dos fertilizantes. “Até o final do ano, a inflação desses insumos deve atingir cerca de 30% em relação a 2024, o que encarece as operações. Com a produtividade em queda, o custo por tonelada de cana produzida tende a subir ainda mais”, explica.

Outro fator de incerteza é a previsão de uma safra global recorde de açúcar, estimada em 189 milhões de toneladas pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Desse montante, o Brasil deve contribuir com cerca de 45 milhões de toneladas, o maior volume da história segundo a Conab.

No entanto, o Departamento projeta ainda que a demanda mundial deva ficar em torno de 177 milhões. Já o consumo doméstico brasileiro deve alcançar 8,9 milhões de toneladas. De forma geral, a perspectiva é que os estoques globais finais da safra 2025/26 cheguem a 41 milhões de toneladas.

Esse desequilíbrio entre oferta e demanda, aliado a conflitos comerciais e incertezas globais, pressiona os preços internacionais, que seguem estabilizados ao redor de 16 cents de dólar por libra-peso. Mesmo diante do cenário adverso, as usinas devem manter o mix açucareiro em cerca de 51%, monitorando constantemente a variação cambial e o comportamento das bolsas para garantir uma estratégia de comercialização mais eficaz.

A queda na produtividade evidencia a fragilidade da cadeia sucroenergética frente às instabilidades climáticas e econômicas. A prova mais clara dessa vulnerabilidade foi o recente encerramento das atividades da Usina Santa Elisa, uma das mais tradicionais do setor, localizada em Ribeirão Preto, epicentro da produção canavieira brasileira.

“Com a quebra de safra, algumas usinas podem não ter cana suficiente para operar com sua capacidade total. Uma unidade com capacidade anual de 3 milhões de toneladas, por exemplo, que perca 500 mil toneladas, enfrentará impacto direto na gestão, com menos açúcar e etanol para comercializar”, alerta Arnaldo Antônio Bortoletto, vice-presidente da Coplacana.

O fechamento da Santa Elisa afetou milhares de trabalhadores e alterou a dinâmica da competição em uma das regiões mais disputadas do Brasil. Essa competitividade intensa torna a operação ainda mais sensível a erros de gestão.

“A disputa é acirrada e muitos produtores estão negociando fora do Consecana, o que aumenta a insegurança por falta de uma referência de preços”, afirma Cyro Penna Junior, vice-presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp).

Apesar da incerteza sobre o destino da usina, o canavial que ela operava já foi redistribuído entre outras unidades. Mas, como destaca Delloiagono, isso traz novos desafios logísticos. “A logística tem limites. Estimamos que o raio ideal para o transporte da cana seja de até 25 km. Em regiões como Sertãozinho, a alta competição pode forçar usinas a buscar matéria-prima mais distante do que isso, elevando custos e exigindo ajustes imediatos na estratégia de gestão”.

Dessa forma, a baixa produtividade, a ausência de preços atualizados e competitivos, além de uma logística cada vez mais apertada, colocam a gestão dos produtores de cana no limite da viabilidade econômica.

“O produtor que não atinge uma média de produtividade de 75 toneladas por hectare, que é o patamar de custo mínimo por área cultivada, enfrentará sérias dificuldades financeiras para manter seu negócio. Além disso, os juros atuais estão muito altos, o que compromete diretamente a renda líquida do produtor na hora de honrar financiamentos. Isso acende um sinal vermelho para a sustentabilidade dos empreendimentos”, avalia Bortoletto.

O cenário se agrava especialmente para os pequenos e médios produtores, que vêm perdendo espaço para os grandes em função dos custos crescentes. No entanto, até os grandes já enfrentam riscos, o que tem estimulado movimentos de verticalização do setor.

“Estamos vendo áreas sendo transferidas entre empresas industriais que buscam ampliar sua área de cana própria como estratégia para mitigar os custos elevados e a redução da remuneração. A escala produtiva torna-se essencial para garantir a viabilidade do negócio em um contexto de margens cada vez mais estreitas”, complementa Penna Junior.

Fonte: Notícias Agrícolas