
Um estudo inédito realizado pela Anfavea em parceria com a Boston Consulting Group (BCG) revelou que caminhões urbanos movidos a diesel com 15% de biodiesel (B15) emitem menos CO? do que caminhões 100% elétricos rodando na China. Segundo o levantamento, o Brasil já possui a menor pegada de carbono do mundo no transporte urbano de carga, resultado da combinação entre biocombustíveis e uma matriz elétrica majoritariamente renovável.
“O B15 se mostra muito mais eficiente do ponto de vista de emissões e, quando operamos com 100% de biodiesel, o caminhão descarboniza quase como um veículo elétrico”, afirmou Igor Calvet, presidente da Anfavea, durante a apresentação do estudo.
Ele ressalta que, apesar de o uso do B100 ainda ser restrito, os resultados comprovam o potencial do biocombustível brasileiro como alternativa de baixo carbono, superando inclusive países que apostam exclusivamente na eletrificação.
O estudo calculou pela primeira vez, de forma completa, as emissões de CO? em toda a cadeia — da extração de matérias-primas até o descarte do veículo — em caminhões, ônibus e automóveis fabricados no Brasil e comparados a modelos equivalentes produzidos na Europa, Estados Unidos e China. A metodologia considera o padrão internacional mais rigoroso de medição.
Os dados mostram que o desempenho brasileiro não se deve apenas ao combustível utilizado, mas também à estrutura energética do país. Atualmente, 90% da matriz elétrica nacional é formada por fontes renováveis, como hidrelétricas, eólicas, solares e biomassa, enquanto 50% de toda a matriz energética também é renovável. Essa diferença explica, por exemplo, por que um caminhão elétrico chinês pode emitir mais de três vezes o CO? de um caminhão urbano brasileiro movido a biodiesel, mesmo sem combustão direta. A energia usada na recarga, quando gerada a partir de carvão ou gás natural, altera totalmente o impacto ambiental do veículo.
Para Masao Ukon, diretor executivo e sócio-sênior do BCG, o Brasil parte de uma posição privilegiada no processo de descarbonização automotiva.
“Temos um arsenal já disponível: biocombustíveis consolidados, matriz elétrica limpa, experiência com motores flex e rotas de transição tecnológicas que não dependem de uma única solução”, afirmou.
Ele reforça que o país já opera com emissões inferiores antes mesmo de eletrificar totalmente a frota — ao contrário das grandes economias globais, que dependem de pesados investimentos para reduzir o uso de fontes fósseis.
O levantamento também avaliou os caminhões rodoviários, segmento em que a eletrificação ainda é considerada inviável em escala por questões de autonomia, peso das baterias e falta de infraestrutura de recarga em longas distâncias. Nesse cenário, o estudo identificou o biometano como a alternativa mais limpa do mundo para transporte pesado. Mesmo com uso ainda limitado no Brasil, o combustível já apresenta emissões inferiores às do gás natural veicular (GNV) utilizado na Europa.
Apesar dos resultados favoráveis, Calvet ressalta que o país precisará sustentar essa vantagem com políticas públicas e ampliação da oferta de combustíveis renováveis. A partir de 2027, o programa Mover passará a exigir o cálculo completo da pegada de carbono no ciclo de vida dos veículos como critério para concessão de benefícios fiscais. “O avanço da descarbonização depende da cadeia inteira, da produção de insumos até o uso do veículo. O estudo mostra onde estão os maiores pontos de emissão em cada etapa, e isso ajuda a orientar indústria, governo, enfim a todos”, afirmou o executivo.
Masao Ukon reforça que a eletrificação seguirá crescendo, mas alerta que o Brasil tem condições únicas de avançar na redução de emissões sem abandonar o motor a combustão.
“Não existe bala de prata. Cada aplicação exige uma tecnologia específica. O importante é que o país já está à frente porque pode combinar matrizes e adotar a solução mais eficiente em cada segmento”, completou.
Por Graziela Potenza
Fonte: Revista Caminhoneiro