
Foto: Abe McNatt/Oficial da Casa Branca
O governo de Donald Trump abriu um novo capítulo no debate energético internacional ao pressionar o Banco Mundial para retomar o financiamento de projetos de petróleo e gás. A medida contraria a política adotada pela instituição desde 2017, que previa o fim do apoio a empreendimentos fósseis a partir de 2019, em alinhamento com os compromissos do Acordo de Paris.
Segundo fontes ouvidas pelo Financial Times, a prioridade da administração norte-americana é reforçar a segurança energética, em especial com novos desenvolvimentos no setor de gás upstream — atividades que envolvem exploração e produção. O movimento também se estende a outros bancos multilaterais de desenvolvimento, que seriam incentivados a apoiar projetos de combustíveis fósseis, como gasodutos.
Histórico: do fim ao retorno do financiamento
Em 2017, o Grupo Banco Mundial anunciou que deixaria de financiar novos projetos de exploração e produção de petróleo e gás a partir de 2019. No entanto, abriu exceções para países de baixa renda, quando comprovado que o financiamento ampliaria o acesso à energia e estivesse em conformidade com metas climáticas.
Nos últimos anos, a instituição e diversos bancos comerciais se afastaram de ativos considerados de alto risco climático, como carvão, petróleo do Ártico e areias betuminosas. O movimento refletia a pressão de acionistas, investidores e organizações da sociedade civil para reduzir a exposição a combustíveis fósseis.
Agora, o governo Trump busca inverter essa tendência. A justificativa apresentada é que o gás natural pode desempenhar papel central no crescimento econômico e na redução da pobreza, ao mesmo tempo em que fortalece a posição dos EUA como um dos maiores exportadores globais de energia.
Argumentos do governo americano
Um porta-voz do Departamento do Tesouro dos EUA afirmou ao FT:
“Uma estratégia energética que inclua todos os itens acima e que preveja o financiamento do gás upstream seria um passo positivo para reconectar o Banco Mundial às suas principais missões de crescimento econômico e redução da pobreza.”
O discurso oficial combina dois pilares: garantir fornecimento estável de energia em países em desenvolvimento e manter a influência geopolítica dos EUA no setor energético. A visão contrasta com os compromissos ambientais assumidos por instituições financeiras nos últimos anos.
Impactos nos bancos e no setor financeiro
A pressão de Trump ocorre em um contexto de realinhamento das grandes instituições financeiras. Após sua vitória eleitoral, bancos e gestores de ativos norte-americanos começaram a abandonar compromissos com alianças de emissão líquida zero.
Entre as mais impactadas está a Net-Zero Banking Alliance (NZBA), que perdeu a adesão de importantes bancos dos EUA e de quatro dos maiores bancos canadenses. A aliança, criada para alinhar carteiras de crédito e investimento a uma economia de baixo carbono até 2050, vê sua credibilidade enfraquecida com a saída de players de peso.
Esse movimento evidencia uma guinada do setor financeiro norte-americano: da ênfase em investimentos sustentáveis para uma retomada agressiva dos combustíveis fósseis.
Repercussões globais e dilema climático
O reposicionamento dos EUA gera tensão entre metas climáticas e necessidades de desenvolvimento econômico. Países pobres, que enfrentam desafios de acesso à energia, podem ser atraídos pelo financiamento para projetos fósseis. Por outro lado, isso representa um retrocesso frente às metas de descarbonização exigidas para conter o aquecimento global.
Organizações ambientais alertam que o incentivo a petróleo e gás compromete os esforços internacionais de mitigação climática, podendo ampliar a dependência de fontes poluentes justamente no momento em que a transição para energias limpas deveria acelerar.
A pressão norte-americana sobre o Banco Mundial sinaliza que o debate energético global seguirá polarizado. Enquanto parte da comunidade internacional busca acelerar a transição para energias renováveis, os EUA, sob Trump, colocam a segurança energética e os combustíveis fósseis de volta ao centro da estratégia econômica.
O desfecho desse embate poderá definir não apenas o papel do Banco Mundial na política energética global, mas também a velocidade da transição para uma matriz de baixo carbono.
Por Nathália Santos
Fonte: A Revista