Antes tradicional, o agronegócio brasileiro está passando por uma revolução tecnológica muito rápida. No epicentro dessa transformação, a inteligência artificial no agro surge como uma peça fundamental, marcando uma mudança significativa nas práticas agrícolas.
Diante do avanço da IA, as empresas do agro estão investindo alto – sozinhas ou em parceria com institutos de pesquisa – no desenvolvimento de soluções para automatizar processos e atividades diárias na fazenda, lavoura e demais segmentos.
Mas você sabe quais são as aplicações mais interessantes da IA no agro?
Convidamos Jayme Barbedo, pesquisador e supervisor do Grupo de Pesquisa em Computação Científica, Engenharia da Informação e Automação da Embrapa Agricultura Digital, para falar sobre o tema. Boa leitura!
Qual é a importância da inteligência artificial no agro?
A IA cada vez mais faz parte do dia a dia das pessoas e em diversos setores, e isso não é diferente no agro.
Diariamente, diversas informações são geradas pelas fazendas. Anotar, passar os dados para planilha e analisá-los é uma tarefa que exige tempo, atenção e conhecimento. Com a IA isso começa a mudar.
Caberá às novas ferramentas digitais e aos algoritmos mais “treinados” e alimentados com imensos volumes de dados, deixar a gestão e a lida no campo mais eficiente, precisa e sustentável.
Jayme Barbedo destaca que já há várias tecnologias digitais aplicadas no campo. “Já temos a ordenha automática e a detecção automática de ervas daninhas em lavouras para atuação localizada. Essas tecnologias já são uma realidade”, destaca.
Além disso, o desenvolvimento da IA generativa e grandes modelos de linguagem (por exemplo, ChatGPT), todo um novo universo de aplicações se abriu em todos os setores da sociedade, incluindo o agro.
Contudo, o pesquisador da Embrapa salienta que essas tecnologias ainda precisam evoluir. “Não devemos perder de vista que elas estão nas mãos de empresas que podem introduzir vieses nas respostas de modo a atender aos seus interesses particulares”.
Portanto, ainda que existam opções tecnológicas muito poderosas, é importante que países como o Brasil invistam na geração de tecnologias nacionais que façam uso de fontes confiáveis e atendam aos reais interesses de suas populações.
6 aplicações principais da IA no agro
Com a capacidade de processar grandes volumes de dados, aprender padrões complexos e tomar decisões, a IA tem a capacidade de transformar radicalmente a forma como as atividades agrícolas são realizadas.
Consequentemente, muitas são as aplicações da IA no agronegócio. Com ampla experiência na área, Jayme Barbedo destaca as 6 mais interessantes. Confira!
1 – Análise avançada de dados geoespaciais
Há cada vez mais satélites gerando dados com alta resolução espacial, temporal e espectral. Contudo, a análise desses dados e a extração de informações úteis ainda é muito manual.
Segundo o pesquisador da Embrapa, isso vem despertando o interesse de muitos grupos de pesquisa. “Eles estão desenvolvendo técnicas para análise automática e objetiva desses dados”, diz.
No caso da agricultura, algumas aplicações com grande apelo prático incluem:
- Mapeamento de uso e cobertura da terra;
- Detecção de estresses em lavouras.
Tais medidas ajudam a acelerar o processo decisório e a aplicação de medidas para conter o problema.
“Dado o interesse que esse assunto suscita, acredito que haverá uma multiplicação de ferramentas desse tipo nos próximos anos”, complementa Barbedo.
2 – Monitoramento em tempo real de lavouras
Além do monitoramento via satélite, são desenvolvidos diversos sensores e técnicas baseadas nos dados por eles, coletados para monitoramento da lavoura.
Os dados gerados incluem imagens da lavoura, variáveis meteorológicas, informações sobre pragas provenientes de armadilhas inteligentes, sensoriamento de solo etc.
Segundo Barbedo, esse monitoramento pode ser feito de duas maneiras:
- Estática, com os sensores instalados em pontos estratégicos da propriedade;
- Dinâmica, usando, por exemplo, drones, máquinas agrícolas e robôs de solo.
Já existem diversas tecnologias voltadas para o monitoramento das lavouras, sendo algumas delas utilizadas na prática, mas muitas delas ainda requerem mais desenvolvimento a fim de lidar com os enormes desafios impostos pelo ambiente agrícola.
3 – Automação de tarefas repetitivas
A automação de tarefas repetitivas foi um dos principais motores para o desenvolvimento industrial nos últimos dois séculos. Essa automação vem crescendo tanto em termos de alcance quanto de sofisticação.
No caso da agricultura, há muitos exemplos de maquinários sofisticados capazes de fazer o plantio e a colheita de maneira totalmente autônoma, especialmente no caso de grãos.
Porém, em áreas como a fruticultura, em que a colheita deve ser feita de maneira cuidadosa para não danificar o produto, o pesquisador indica que esse tem sido um problema difícil de resolver.
“Já há robôs capazes de realizar a colheita de frutas de maneira a evitar danos, porém eles ainda possuem diversas limitações que, aos poucos, estão sendo vencidas nas pesquisas”, salienta o pesquisador
Outras atividades repetitivas como o transporte, acondicionamento e seleção de produtos também vêm sendo automatizadas, e com o rápido desenvolvimento das tecnologias baseadas em IA essa tendência deve se intensificar nos próximos anos.
4 – Otimização da irrigação e fertilização
A irrigação e a fertilização de lavouras ainda são, em muitos casos, feitas de maneira subjetiva e com base em um conjunto de informações que nem sempre reflete as reais necessidades da lavoura.
Com a evolução e o barateamento dos sensores de campo, agricultores têm acesso a uma quantidade muito grande de dados que, se explorados adequadamente, podem levar a um manejo muito próximo do ideal.
Porém, essa não é uma tarefa trivial, sendo algo difícil de ser alcançado até mesmo utilizando modelos de manejo desenvolvidos através de pesquisa científica cuidadosa. “É exatamente nesse tipo de aplicação que a IA tende a ser mais útil”, afirma Barbedo.
Ou seja, quando os modelos de IA são bem treinados com dados de boa qualidade, eles são capazes de implicitamente aprender todos os padrões relacionados ao problema que se deseja resolver, fornecendo respostas muito próximas do ideal sem a necessidade de se modelar cada parâmetro (tipo de dado) explicitamente.
Nos últimos anos, há uma rápida proliferação de tecnologias deste tipo, porém nem todos os produtores estão dispostos a adotá-las. “Um processo de capacitação e convencimento ainda se faz necessário”, sugere o pesquisador.
5 – Aplicação mais precisa de insumos
Como mencionado anteriormente, já há máquinas agrícolas equipadas com dispositivos para detectar e eliminar ervas daninhas de maneira automática e localizada. O objetivo é que sejam desenvolvidas tecnologias similares para doenças, pragas e também voltadas à nutrição, elevando a inteligência artificial do agro a um novo patamar.
Porém, segundo o pesquisador da Embrapa, o grande gargalo hoje é gerar dados suficientes para representar toda a variedade de condições encontrada na prática, mas assim que essa questão for sanada, os avanços serão rápidos: “Uma vez que esse problema seja resolvido, novas tecnologias oferecendo robustez suficiente para lidar com a realidade das lavouras deverão surgir rapidamente”.
6 – Previsão de safras e condições climáticas
Modelos de previsão de safra baseados em condições climáticas já existem há bastante tempo e contribuem com o agro de diversas formas. Porém, com o desenvolvimento da IA no agro, mais variáveis estão sendo incorporadas a esses modelos, incluindo imagens de satélite e outras informações que antes não podiam ser exploradas devido às limitações dos modelos convencionais.
“Com esses avanços, o índice de acerto dos modelos de previsão de safra vem aumentando rapidamente, e essa é uma tendência que deve continuar pelos próximos anos”, afirma Jayme Barbedo.
Diante destas muitas aplicações, fica claro que o uso da inteligência artificial no agro tem o poder de impulsionar o agronegócio para além dos limites do que é possível atualmente. À medida que exploramos e implementamos as tendências futuras da IA, temos a oportunidade de criar um setor agrícola mais eficiente, preciso e sustentável.
Fonte: Agrishow Digital