
Por Rafael Gregorio
Enquanto ainda digerem a ressaca dos anos anteriores, os produtores de grãos devem encarar um aperto nas margens na próxima safra devido ao aumento nos custos com fertilizantes, mantendo o clima de cautela no setor. Essa é a visão do Itaú BBA para 2025-2026.
“Há dinâmicas de curto prazo que trazem preocupação. Notadamente a capacidade de financiamento, especialmente para os médios produtores. E vemos uma voltinha no parafuso em termos de compressão de margens, principalmente na relação de troca com fertilizantes”, afirmou Pedro Fernandes, diretor de agronegócios do Itaú BBA.
Cesar de Castro Alves, gerente da consultoria Agro do Itaú BBA, acrescenta que a depender da commodity, será preciso um aumento significativo de produtividade para amenizar a esperada compressão das margens.
“Olhando os balanços até aqui, não dá para ficar otimista e fugir do tom de cautela que adotamos nos últimos dois anos. Foram anos de ressaca que ainda não terminou; a gente não visualiza as coisas melhorando para todos os elos da cadeia até 2026”, afirmou nesta quinta-feira a jornalistas.
Nesse contexto, a gestão de riscos na formação de custos vai ser mais desafiadora — e determinante, ele diz. “Além das taxas de juros altas no mundo, o cenário global bate diretamente nos custos de fertilizantes. O agravamento no Oriente Médio aumenta o risco para os nitrogenados, porque o conflito envolve países produtores de ureia.”
Para a soja, a consultoria agro do banco estima um aumento de 8,5% nos custos de produção, puxado pela alta dos fertilizantes. A produtividade, recorde em 2024-2025, deve voltar para níveis médios, enquanto a perspectiva para os preços é baixista diante da possibilidade de mais uma colheita farta no Brasil, segundo Francisco Queiroz, analista de grãos da consultoria.
No caso do milho, o cenário é mais incerto — e arriscado. Se na soja cerca de 80% dos fertilizantes necessários para o plantio que começa em setembro já estão comprados, no caso do milho safrinha menos de um terço foi adquirido até agora. “Ou seja, é caro, e pode ficar ainda mais caro”, disse Alves.
Por enquanto, a consultoria estima que os custos vão aumentar 8%, com os gastos com fertilizantes subindo 20%. Vale lembrar que os fertilizantes nitrogenados, impactados pelos conflitos no Oriente Médio, são altamente demandados para o plantio de milho, enquanto a soja não necessita desse tipo de nutriente. No caso da oleaginosa, os custos serão mais afetados pela alta dos fosfatados.
Esse cenário, somado ao alto custo do capital, significa que uma parte relevante dos resultados no campo será absorvida pelas despesas financeiras, diz o banco em seu relatório Visão Agro 2025/26. “O espaço para erros, portanto, será mínimo.”
Área cresce menos
A compressão de margens deve limitar o crescimento de área plantada de milho, a despeito do aumento da demanda por etanol de milho puxado pelo aumento da mistura do etanol anidro à gasolina de 27,5% para 30%, a partir de 1º de agosto.
“Entendemos que a área de milho deve crescer, mas em um ritmo aquém da expectativa e do ano passado”, disse Queiroz. No balanço global, a projeção é de aumento da produção no embalo de um recorde nos EUA, batendo em 400 milhões de toneladas de milho.
“Para o Brasil, ainda é muito cedo para falar de 2025/26, pensando que quase 80% da nossa oferta vem da segunda safra. Mas teríamos potencial para ao menos repetir a safra deste ano, próxima de 130 milhões de toneladas”, afirma Queiroz.
A soja também deve ter um aumento da área plantada inferior ao patamar dos últimos anos devido às margens mais apertadas e o cenário de crédito mais restrito.
“O USDA prevê mais 1 milhão de hectares de aumento de área. Esperamos um pouco menos. Mas concordamos com a projeção de 175 milhões de toneladas; com a previsão climática em normalidade, mesmo uma produtividade dentro da média já nos levaria a um potencial novo recorde”, explicou Queiroz.
Margens menores no café e na cana
No relatório, o Itaú BBA afirma que a deterioração nas margens também afetará outras culturas, como café, laranja e cana-de-açúcar, “que realizam compras de insumos no segundo semestre e já enfrentam quedas expressivas de preços”.
No açúcar, o banco diz que o ritmo vem sendo dado pela perspectiva de alta de 4,6% na produção global, puxada pela Índia, que vai produzir 18% mais.
No Brasil, o banco projeta uma redução de 6% na disponibilidade de cana, mas um aumento na produção de açúcar de 1,2%, para 40,8 milhões de toneladas, resultado de um crescimento na capacidade de cristalização, segundo o analista Lucas Brunetti.
As expectativas interna e externa pressionam os preços — com mais efeito na safra 2026/27, “já que boa parte da produção atual já está fixada”, lembra o banco.
No café, o Itaú BBA vê uma recuperação para 70 milhões de sacas, no embalo de uma produção recorde de robusta. “O arábica a R$ 1,5 mil a saca ainda é um excelente negócio. Vamos ver o mercado mais folgado”, diz Castro Alves.
Para o trigo, o cenário é de intensa competitividade, com safras marcantes na Argentina e na Rússia, grandes exportadores para o Brasil. “A oferta deve prejudicar o preço, acaba entrando trigo mais barato e nossa paridade de exportação cai. Isso precisa entrar na conta de gerenciamento de riscos do produtor”, diz a analista Marina Marangon.
No algodão, o Brasil deve ser o único entre os grandes produtores a crescer a produção, enquanto EUA, China e Índia terão retrações de volume e área plantada. O consumo é uma incógnita diante das incertezas macroeconômicas, diz Queiroz, e o produtor brasileiro deve ficar atento à potencial redução no preço do caroço, que colaborou para ampliar a margem na última safra.
E, na laranja, a aposta é em uma recomposição dos estoques de suco da indústria, ao encontro da estimativa de uma safra 36% melhor, que fará crescer em 4% a produção global de suco.
“Essa expectativa já fez o preço cair mais de 50% desde o início do ano. A indústria acabou processando frutas que não eram de primeira linha, o estoque atual tem qualidade um pouco inferior; a safra que está vindo vai servir para fazer um blend”, diz Wharlhey Nunes, do Itaú BBA.
Fonte: The AgriBiz