
Por Karina Souza
Entre todos os campos de estudo que alguém pode escolher na agronomia, Gustavo Hermann e Danilo Pedrazzoli optaram, ainda no início dos anos 2000, pelos parasitas. Não necessariamente para combatê-los – mas sim para usá-los no combate às pragas no campo. Os estudos viraram uma startup e , dez anos depois, resultaram na vinda da gigante holandesa Koppert ao Brasil.
“Quando começamos nesse segmento com uma empresa pequena, décadas atrás, tínhamos apenas um produto. A gene brincava que estava entrando de faca no tiroteio, tentando vender um biológico no meio de 50 químicos, e via a necessidade de mais tecnologia e mais portfólio”, disse Herrmann, ao The AgriBiz, em uma entrevista concedida na sede da Koppert em Piracicaba (SP).
A necessidade coincidiu com a vontade da empresa holandesa de se instalar no Brasil. Fundada há mais de 50 anos, a Koppert nasceu a partir de uma necessidade do agricultor Jan Koppert, que precisava resolver pragas em sua plantação de pepino. Resolveu, então, buscar uma rota alternativa aos químicos e, junto com uma universidade holandesa, conseguiu descobrir o primeiro ácaro capaz de resolver problemas de pragas, em 1967.
Com esse DNA de pesquisa, a empresa desembarcou no Brasil em 2011, pelas mãos dos dois amigos. No escritório, em Piracicaba, eram três pessoas: os dois sócios e mais uma secretária. Catorze anos, seis aquisições e três fábricas depois, a empresa tem hoje 750 funcionários e fatura cerca de R$ 1 bilhão no Brasil — aproximadamente 30% do faturamento global. Ainda é só o começo.
Nas contas da Koppert, só a área tratada de soja no Brasil (contando todas as vezes em que ela houve aplicação de defensivos) chegou a um bilhão de hectares na safra 2023-24. Destes, 20 milhões de hectares tiveram algum tipo de aplicação de defensivos biológicos. Hoje, a cultura é responsável por 40% das vendas da empresa, com um percentual semelhante abocanhado pela cana-de-açúcar.
O número atual — apesar de ainda representar uma porção ínfima diante da área total — reflete um crescimento acelerado da adoção dos biológicos no País desde 2018. A partir desse intervalo, a conjunção de fatores de alta de preço da soja, depois do milho, somada ao aumento nos preços dos insumos (principalmente importados) na pandemia, trouxe um momento de glória para o defensivo biológico.
Nos últimos dois anos, entretanto, esse crescimento exponencial arrefeceu. Não significa que o setor tenha deixado de ganhar mercado, mas o ritmo diminuiu diante da reversão quase completa desse cenário de bonança. Daqui para frente, as expectativas da Koppert são mais otimistas.
Com base em projeções de um estoque de químicos reduzido para a safra 2025-26, a companhia projeta uma aceleração do uso de biológicos. Traduzindo essa expectativa, nas contas da Koppert, o mercado de defensivos biológicos cresceu, na média, 8% na safra 2024-25. A perspectiva é que esse percentual dobre na 2025-2-26.
Em uma visão de mais longo prazo, a entrada de multinacionais no biológico também é vista de forma positiva, já que aumenta o bolo dedicado ao setor. “Nós temos um portfólio maior porque fazemos só isso, mas essa diversificação, com investimento de grandes empresas em tecnologia, ajuda a trazer mais credibilidade para o produtor”, frisa Herrmann.
O argumento da rastreabilidade e sustentabilidade também tem ganhado cada vez mais força. Hoje, as grandes indústrias de suco de laranja já são clientes da Koppert, que também tem sido mais requisitada por produtores de algodão e de café.
“Nós não estamos falando de produção orgânica. Nosso foco é o manejo integrado, colocando o produto biológico principalmente na época do fruto, para ter um menor resíduo”, explica o executivo. Na média, Herrmann aponta que é possível reduzir entre 30% e 40% as aplicações químicas com o portfólio disponível hoje.
O que falta para avancar
Aumentar a adoção dos biológicos, ano após ano, depende principalmente de difusão de conhecimento. Hoje, órgãos como Embrapa, Fundação MT, Fundação MS, Fundação Bahia e universidades já começam a espalhar informações sobre o assunto, mas ainda de forma incipiente diante da necessidade do dia a dia dos produtores.
“Para mim, hoje, essa é a maior barreira. A gente tem que investir cada vez mais nessas redes para não serem só as empresas falando, porque cada uma vai querer defender o seu. O produtor tem que aprender com agrônomos, consultores, academia e tudo mais”, afirma Herrmann.
Em paralelo à difusão de conhecimento, empresas trabalham de forma acelerada na busca por novas tecnologias, de olho em aumentar (ou melhorar) o portfólio de produtos. Num exemplo, hoje, uma parte dos biológicos ainda enfrenta um gargalo logístico nada desprezível, que afeta a margem das revendas na ponta e, é claro, o preço ao produtor.
A maior parte do que a Koppert vende, hoje, no Brasil, é a formada por produtos à base de fungos ou de bactérias. Armazenar as bactérias em temperatura ambiente é possível (e elas duram até três anos assim), enquanto os fungos são muito mais complexos e exigem logística refrigerada – um gargalo relevante em um país de dimensões continentais.
“A gente já conseguiu transpor essa barreira, mas quem está entrando terá de lidar com ela. Nosso foco de pesquisa é conseguir manter esses organismos vivos, sem diminuir o metabolismo deles”, explica Thiago Rodrigues de Castro, gerente de P&D e doutor em patologia e controle microbiano de insetos.
No campo dessas pesquisas, a Koppert não trabalha com fungos transgênicos. “Não queremos sair do natural. A natureza é tão vasta, tão diversa, que nós acreditamos que não é preciso inventar nada, só encontrar”, afirma o executivo.
Na busca por tendências, além dos estudos próprios, a Koppert mantém um centro de pesquisas chamado SPARCBio, em parceria com a Fapesp, Esalq-USP e Jacto, fabricante de implementos agrícolas. Por meio desse hub, a empresa já tem candidatos, por exemplo, a herbicidas biológicos. Não é um trabalho de curto prazo. Na melhor das hipóteses, quatro anos, e na pior das hipóteses, nove a dez anos.
Os herbicidas, responsáveis por um terço do consumo de defensivos no Brasil, são uma das tecnologias mais difíceis de serem contornadas por uma rota alternativa. O ponto aqui é a similaridade com as plantas cultivadas.
“Mesmo nas químicas que produzem os herbicidas tradicionais, não tem muitas moléculas, porque quando ela é tóxica para uma planta, ela vai ser tóxica para outra planta também. Encontrar essas moléculas seletivas é muito difícil”, explica o gerente de P&D.
Não que o processo de produção dos defensivos comercializados hoje pela Koppert seja algo simples. Longe disso, trata-se de um processo de produção delicado por essência. A produção de fungos, por exemplo, passa por uma série de etapas — e qualquer falha em uma delas leva ao descarte de todo aquele lote. Por dia, a produção é de 10 toneladas.
Fonte: The AgriBizz