Japão vai misturar etanol a combustível, e Ásia surge como antídoto a Trump

Evento destacou a importância do SAF durante a Exposição Aeroespacial
Internacional do Japão 2024 – Crédito: UNICA/Divulgação

Por Felipe Pereira e Jamil Chade

O Brasil quer fugir da dependência dos gigantes econômicos —China e Estados Unidos—, e o Japão é a porta de entrada para novos mercados asiáticos. O movimento tem como objetivo enfrentar a guerra comercial iniciada por Donald Trump.

O que aconteceu

O presidente Lula tem intensificado conversas com países asiáticos. Lula já realizou viagens para o Japão e o Vietnã, num gesto que simboliza a busca por um leque de opções que vá além da China. A expectativa é firmar acordos e recompor perdas comerciais com os Estados Unidos. Há dois caminhos possíveis: parcerias bilaterais e parcerias entre blocos, o que envolveria o Mercosul.

Tóquio foi o primeiro destino na Ásia porque Japão e Brasil se anteciparam ao protecionismo de Trump. As tratativas entre os dois países começaram no G20, realizado no Rio, em novembro do ano passado. Três motivos foram decisivos para ambos sentarem à mesa de negociações:

• Comprometimento com a transição energética;
• Relação comercial de longa data;
• Balança comercial equilibrada.

A possibilidade de um acordo com o Mercosul se tornou real. A afirmação é de Rafael Cecconello, diretor de Assuntos Regulatórios e Governamentais da Toyota e que esteve na comitiva de Lula ao Japão.
Ele explicou que os dois países sairiam ganhando. Brasil e Japão têm um portfólio de produtos complementar e estão empenhados com a política de neutralidade de carbono.

Em 26 de março, Brasil e Japão assinaram dois memorandos. Eles tratam de combustíveis sustentáveis e da expansão da colaboração industrial entre os dois países.

Mercado aberto para etanol

O setor açucareiro brasileiro será bastante beneficiado. O Japão vai acrescentar 10% de etanol no combustível (E10) até 2030. O percentual vai dobrar na década seguinte.

O Brasil já exporta etanol ao Japão, mas a perspectiva é atingir volumes consideráveis. É esperada a venda de cerca de 4,45 bilhões de litros por ano com a adoção da mistura de 10% de etanol na gasolina até 2030.

Esse volume dobra a partir de 2040. A projeção é de uma demanda de 9 bilhões de litros anuais. As previsões foram fornecidas por Evandro Gussi, presidente da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia).

Ele avalia que o Japão servirá de vitrine na Ásia. Gussi esteve na comitiva de Lula ao Japão e afirma que a Índia já manifestou interesse pelo etanol brasileiro. O presidente da Unica disse que há espaço para vendas a Malásia, Indonésia e Tailândia.

Navios e aviões também são alvo de negociação do governo brasileiro. A intenção é acrescentar etanol aos combustíveis destes meios de transporte. O surgimento de demanda da aviação é garantido. O Japão tem metas de inclusão de etanol em combustível para aeronaves.

Foi estabelecido que 10% dos voos internacionais do país usem SAF (Combustível Sustentável de Aviação). A demanda por etanol será de 3 bilhões de litros por ano. “O Japão pode ser o catalisador dessa nova rota asiática para o biocombustível brasileiro”, afirma Evandro Gussi, presidente da Unica

Marcha para o leste

As viagens para a Ásia estavam sendo pensadas antes mesmo de Trump assumir. Elas ganharam nova dimensão diante das incertezas sobre o destino do governo norte-americano. Lula vai à China no segundo semestre. Trata-se de um sinal claro de que os dois países querem estabelecer uma relação mais próxima para lidar com as truculências do governo Trump.

O Brasil prevê oportunidades de negócios. A justificativa é que Pequim aproveitará o protecionismo americano para expandir suas relações com a América Latina. Mas a intenção brasileira de não depender de Estados Unidos e China coloca outros países na rota. Uma das apostas é a Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático).

O bloco conta com dez integrantes: Brunei, Camboja, Filipinas, Indonésia, Laos, Malásia, Mianmar, Singapura, Tailândia e Vietnã. A região terá expansão superior a 4% neste ano. Também foi considerada pelo Fórum Econômico Mundial como uma das áreas mais promissoras para negócios no mundo até o final da década.

O presidente irá para a cúpula do bloco na Malásia, em outubro. Lula aproveitará a ocasião visitar a Indonésia, um dos maiores mercados para a exportação brasileira na região. Um pacto comercial entre o Mercosul e o governo de Jacarta está no horizonte. Não se exclui ainda um acordo comercial do Mercosul com o Japão e outro com o Vietnã.

Os asiáticos também estão fazendo o caminho inverso e procurando o Brasil. O governo Lula deve receber as autoridades indianas. A esperança é que novos acordos comerciais possam ser anunciados.
A Índia manifestou interesse por minerais que servem para a indústria atômica. O contato foi feito com o deputado Julio Lopes (PP-RJ), presidente da Frente Parlamentar Brasil Competitivo.

O agronegócio projeta oportunidades em Singapura, Japão, Índia e China. A avaliação é do deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária. Ele ressalta a necessidade de diversificação no setor. Hoje, 52% das exportações do agro vão para a China. A posição brasileira ficaria abalada se Pequim e Washington firmarem um acordo futuro.

Fonte: UOL