Empresas que aderirem ao Mover terão de medir emissões de carbono “do poço à roda”

Lula e Alckmin no lançamento da Nova Indústria Brasil
Foto: Brenno Carvalho / Agência O Globo

Por Alice Cravo

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assina nesta terça-feira, 26, uma portaria que estabelece os requisitos obrigatórios para habilitação de empresas do setor automotivo e concessão de créditos financeiros relacionados ao Programa Nacional de Mobilidade Verde e Inovação (Mover). Lula assina ainda um decreto regulamentando a emissão das “debêntures de infraestrutura” e das “debêntures incentivadas”.

O programa Mover amplia exigências de sustentabilidade na comercialização de carros no Brasil e concede incentivos fiscais a empresas que investirem em descarbonização. O descumprimento dos requisitos, compromissos, condições e obrigações pode acarretar o cancelamento da habilitação com efeitos retroativos ou suspensão da habilitação.

A previsão é que haja R$ 19,3 bilhões de créditos financeiros entre 2024 e 2028, que podem ser usados para abatimento de impostos em contrapartida a investimentos realizados em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e em novos projetos de produção. O governo ainda publicará a portaria regulamentando os investimentos mínimos em P&D.

O projeto prevê, ainda, a criação do Fundo Nacional para Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT), com recursos que serão aplicados e programas prioritários para a cadeia automotiva.

Na semana passada, o governo enviou ao Congresso Nacional um PL instituindo o programa, que tramitará em paralelo à MP enviada em dezembro pelo governo. Os dois textos são idênticos, segundo o Palácio do Planalto.

De acordo com a MP, o valor do programa será de R$ 3,5 bilhões em 2024, R$ 3,8 bilhões em 2025, R$ 3,9 bilhões em 2026, R$ 4 bilhões em 2027 e R$ 4,1 bilhões em 2028. Assim como os seus programas antecessores – Rota 2030, de 2018, e Inovar Auto, de 2012 – o Mover tem como objetivo reduzir em 50% as emissões de carbono até 2030.

O vice-presidente da República e ministro do Desenvolvimento Indústria e Comércio (MDIC) afirmou que não haverá renúncia fiscal com o programa e que os valores de 2024 já estão previstos no orçamento.

“Os R$ 3,5 bilhões de crédito financeiro já estão previstos no orçamento, não tem nenhum déficit, já estava previsto na peça orçamentária. Isso já vinha de anos anteriores e, somando a Reforma Tributária, mais a queda da taxa de juros e mais o marco de garantias, imagina um crescimento de 12% na venda de veículos esse ano”, disse.

Alckmin afirmou ainda que o programa pode trazer um aumento de cerca de 40% na geração de empregos diretos, além de um aumento nos direto e indireto. “Podemos chegar a 150 mil empregos diretos, um crescimento de quase 40%. Direto e indireto hoje está em 1,2 milhão e podemos chegar a 1,5 milhão”.

Uso de material reciclável

Entre as novas exigências previstas no programa, está a medição das emissões de carbono “do poço à roda”, o que considera o ciclo completo da fonte de energia utilizada no veículo – etanol, gasolina, bateria elétrica ou biocombustível. Antes, era levado em conta a medição do “tanque à roda”.

No caso da gasolina, por exemplo, a medição é feita desde a extração de petróleo no mar até a queima do combustível no carro. No do etanol, desde a plantação de cana-de-açúcar.

Outro requisito obrigatório previsto será o uso de material reciclado na fabricação dos veículos, com índice mínimo que ainda deve ser definido pelo governo federal.

A MP também previa um sistema de recompensa e penalização na cobrança de IPI (tributação de acordo com os níveis de sustentabilidade dos veículos) às empresas. A ideia é que quem poluir menos pagará menos imposto e quem poluir mais, mais tributo.

O governo ainda publicará portarias que definem as alíquotas do IPI Verde e uma que estabelece parâmetros obrigatórios para comercialização de carros novos produzidos no país ou importados, relacionados à eficiência energética, à rotulagem veicular, à reciclabilidade e à segurança.

Alckmin afirmou nesta terça-feira que o IPI Verde ainda está em discussão dentro do governo. “O IPI Verde ainda não está fechado. Na hora que estiver definido, vamos divulgar”, disse.

Requisitos obrigatórios

Podem se habilitar as empresas que:

  • Fabriquem no país produtos automotivos
  • Tenham projeto de desenvolvimento e produção tecnológica
  • Desenvolvam no país serviços de pesquisa, desenvolvimento, inovação ou engenharia destinados à cadeia automotiva
  • Sejam tributadas pelo regime de lucro real
  • Possuam centro de custo de pesquisa e desenvolvimento
  • Assumam compromisso de realização de investimentos obrigatórios em pesquisa e desenvolvimento, nos percentuais mínimos exigidos, incidentes sobre a receita bruta total da venda de bens e serviços, excluídos os impostos e as contribuições incidentes sobre a venda

Os projetos de investimento vão valer para as empresas que fabricarem novos produtos ou novos modelos de produtos existentes e que aloque unidades industriais, linhas de produção ou célula de produção incluindo o controle de qualidade do processo fabril e para a realização de pesquisa e desenvolvimento. As empresas deverão ainda ter unidades destinadas à reciclagem ou à economia circular na cadeia automotiva instaladas no Brasil.

Os projetos de investimento deverão:

  • Identificar os produtos ou os sistemas e soluções estratégicas para mobilidade e logística que serão produzidos, com descrição e características técnicas
  • Prever novos investimentos em ativos fixos e em pesquisa e desenvolvimento
  • Conter cronograma físico-financeiro
  • Detalhar os processos industriais e tecnológicos que serão realizados
  • Os processos industriais e tecnológicos deverão envolver a agregação de valor ao produto no país; apresentar diferenças observáveis no bem ou serviço entre os processos; e implicar mudança de classificação tarifária entre o primeiro e o último processo

Os investimentos em pesquisa e desenvolvimento ainda precisam estar relacionados com a indústria da mobilidade e logística, além ser realizado por pessoa jurídica habilitada. Os investimentos poderão ser realizados sob a forma de aportes no Fundo de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico (FNDIT).

Haverá ainda crédito adicionais para P&D quando a empresa realizar atividades fabris e de infraestrutura de engenharia; diversificar mercados; capacitar fornecedores; entre outros.

Debêntures

Lula assinou também o decreto que regulamenta a emissão das “debêntures de infraestrutura” e das “debêntures incentivadas”.

O texto, segundo o Palácio do Planalto, estabelece critérios para o enquadramento e acompanhamento dos projetos de investimento considerados prioritários na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação.

Com isso, o governo vai definir as iniciativas que vão poder ter financiamento impulsionado pelas novas debêntures, que contarão com incentivo fiscal.

O decreto ainda não foi publicado. Segundo o Ministério da Fazenda, o texto “estabelece critérios claros e objetivos para o enquadramento e acompanhamento dos projetos de investimento considerados prioritários na área de infraestrutura ou de produção econômica intensiva em pesquisa, desenvolvimento e inovação”.

As debêntures de infraestrutura serão uma forma complementar às debêntures incentivadas, que também serão regulamentadas no decreto.

Um dos pontos do texto, segundo a Fazenda, é a desburocratização no acesso ao mecanismo de financiamento. Agora, não será necessária a “publicação de portaria ministerial prévia de aprovação dos projetos, cabendo ao titular do projeto assegurar seu enquadramento nos requisitos estabelecidos pelo decreto”.

Serão priorizados projetos que gerem benefícios ambientais ou sociais relevantes e serão rejeitadas iniciativas com prejuízos ao meio ambiente. O decreto também mantém o incentivo a projetos em setores com alta demanda por investimentos, como transportes, e infraestrutura social.

As debêntures de infraestrutura oferecem benefícios fiscais diretamente às empresas emissoras, possibilitando a oferta de melhores remunerações nas emissões dos títulos. A nova modalidade permite a dedução de juros pagos na apuração de seu lucro líquido e na sua base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

O texto permite também a exclusão adicional de 30% dos juros pagos no exercício na apuração do lucro real e na base de cálculo da CSLL, além de ampliar o prazo de 24 para até 60 meses para retroagir na quitação dos gastos, despesas ou dívidas possíveis de reembolso.

Fonte: O Globo