
Por Luís Nassif
As informações abaixo foram retiradas de uma entrevista com a ANBC (Associação Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis), que representa as distribuidoras regionais. Expressa seu ponto de vista, mas traz informações relevantes sobre o RenovaBio.
Hoje em dia, há inúmeros projetos prioritários sem orçamento para caminhar, é hoje é dia de discutir o RenovaBio. (Política Nacional de Biocombustíveis). Para 2025 estima-se que sejam emitidos 40,6 milhões de CBios, equivalente a R$ 3,1 bilhões em custos para as distribuidoras, que obviamente são repassados para os consumidores. Em 10 anos, a projeção é de R$ 609 milhões de CBios, equivalentes a R$ 46,3 bilhões, um enorme subsídio.
Todo esse recurso vai para as usinas produtoras de etanol. O setor é o maior beneficiário dos estudos da Embrapa, mas os recursos do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), maior financiadora da Embrapa, vem fundamentalmente dos setores de energia e telecomunicações.
Explicando: o RenovaBio é uma política pública criada em 2017 (Lei nº 13.576/2017) com o objetivo de reduzir as emissões de gases de efeito estufa no setor de combustíveis, estimulando a produção e o uso de biocombustíveis sustentáveis (como etanol e biodiesel). Mas segue a máxima brasileira na qual qualquer programa de incentivo termina nas mãos de lobbies.
O sistema funciona assim:
- As usinas produtoras (de etanol, biodiesel, biometano, etc.) são avaliadas com base em sua intensidade de carbono (quanto gás carbônico emitem por litro produzido).
- Quem tem produção mais eficiente e sustentável ganha mais créditos de descarbonização.
- Cada produtor certificado pode emitir 1 CBIO para cada tonelada de CO₂ evitada.
- Os CBIOs são vendidos na B3 (bolsa de valores).
- Distribuidoras de combustíveis fósseis (gasolina, diesel) são obrigadas por lei a comprar CBIOs todo ano.
- O número de CBIOs exigido é calculado com base nas metas de descarbonização fixadas pelo governo.
O programa foi aprovado sem audiência pública e regulamentado rapidamente em 2018, no período dos grandes negócios públicos. Em 2020 a Confederação Nacional da Agricultura entrou com um Projeto de Lei cobrando o repasse. A Lei 15082/2020 previa repasse de parte dos lucros do RenovaBio aos agricultores — não cumprido. E os subsídios acabaram indo integralmente para as usinas.
Não há a necessidade de comprovar o aumento da eficiência. Todo ano é uma montanha de subsídios para as usinas. Pesquisas tecnológicas não recebem um centavo desse fundo.
O setor é o principal beneficiário das pesquisas da Embrapa.
O modelo funciona assim:
- Certificação de produtores pela ANP (Agência Nacional de Petróleo), com critérios de sustentabilidade.
- Metas de descarbonização, definidas pelo MME (Ministério de Minas e Energia)..
- Créditos de Descarbonização (CBIOs) negociados na B3:
- Quem produz biocombustível emite
- Distribuidoras são obrigadas a comprar
- Relação econômica anômala: vendedor vende se quiser, comprador é forçado a comprar.
As certificadoras são contratadas e pagas pelos auditados. Por isso mesmo, há a possibilidade de empresas com desmate ilegal, trabalho escravo ou sem regularização fundiária emitirem títulos. Isso porque as empresas podem usar dados padrão, sem verificação concreta do uso do solo, técnicas agronômicas e dados reais.
Além disso, a certificação não exige práticas novas: títulos são emitidos mesmo sem inovação ou ganho ambiental adicional. Tanto assim, que a intensidade de carbono média dos combustíveis praticamente não melhorou de 2019 a 2024. E o programa não aumentou, em termos proporcionais, o volume de biocombustíveis.
O mercado de combustíveis
Aí se entra em outro campo, o da competição no mercado de combustíveis. Hoje em dia, 3 grandes companhias controlam cerca de 60% do mercado. O restante é dividido por 150 pequenas distribuidoras regionais, com menor escala e poder de barganha, mas que garantem a cobertura nacional para 98% dos municípios.
Junto com as grandes, garantem a homogeneização dos combustíveis, pela mistura obrigatório de etanol anidro à gasolina e biodiesel ao diesel. As Distribuidoras não podem alterar os percentuais obrigatórios de mistura (exceto para o hidratado). Portanto, não há margem para redução adicional da intensidade de carbono via mandado – só com ações voluntárias.
Além disso, grandes empresas passaram a articular para criminalizar distribuidoras independentes, sem processo legal adequado, que não estivessem em dia com as metas do RenovaBio. Criaram listas negras e retirada de acesso a fornecedores, transferindo o poder de política para entes privados, ameaçando a sobrevivência de distribuidoras menores e postos em comunidades pequenas.
Fonte: Jornal GGN