Combustível do futuro é caminho, mas exigirá fiscalização

Foto: Fernando Pires/Quatro Rodas

Por Emerson Kapaz*

O projeto do “Combustível do Futuro”, que estabelece um novo patamar para a participação de recursos renováveis na mistura dos combustíveis fósseis, é um passo importante que o Brasil está dando na caminhada por se tornar um protagonista da economia verde. O consenso global em torno da necessidade de evitarmos mais poluição e o efeito estufa, assim como o aumento da temperatura do planeta e as consequências que já estamos enfrentando por conta das mudanças climáticas, contribui para a urgência desta agenda legislativa.

Aprovado pela Câmara e em análise pelo Senado, o texto do PL estabelece uma mistura de 25% de biodiesel ao diesel até 2030. Se por um lado, a mudança indica um investimento nacional na descarbonização do setor de transportes, por outro ela aumenta a importância de uma ampla fiscalização, vistorias e inspeções nos postos e em distribuidoras para garantir um ambiente ético e leal, evitando qualquer tipo de irregularidade nas misturas.

Somente no ano passado, encontramos cerca de 170 milhões de litros de diesel contaminados com biodiesel fora do padrão, gerando impacto aproximado para 850 mil veículos leves e pesados em todo território nacional. Estados como Alagoas, Bahia, São Paulo, Minas Gerais e Amapá lideram o ranking nacional da mistura desses combustíveis fora do padrão de conformidade.

A realidade de nosso país mostra que muitas distribuidoras e postos têm comercializado o combustível sem o biodiesel ou com percentual baixo. Para se ter uma ideia, estimativas do mercado demonstram sobra superior a 120 milhões de litros de biodiesel em 2023, mais que o dobro da estocagem de 2022, o que é um forte indício de consumo abaixo da exigência regulatória.

Além de ser um combustível que colabora com a redução das emissões de CO2 e com o mercado de crédito de descarbonização (Cbio), o biodiesel apresenta facilidade de armazenamento e transporte, contribuindo para a economia do país, gerando mais empregos.

Outro relevante tópico do projeto de lei do Combustível do Futuro é o aumento do etanol anidro na gasolina C para um teor de até 35%. Importante destacar que toda alteração ainda necessita dos devidos testes de viabilidade técnica, bem como ampla análise do cumprimento do percentual pelo mercado. Nos últimos anos, temos observado que a adulteração na gasolina C acontece geralmente com o aumento da quantidade de etanol anidro acima do limite permitido por lei, com registros de teores acima de 70%. Em análise recente, verificamos que o índice de não conformidade da gasolina tipo C equivale a 691 milhões de litros vendidos em 2023.

Ainda para contribuir com a redução de fraudes no setor nacional de combustíveis, é essencial a incorporação do sistema monofásico – com alíquota uniforme, cobrada na produção/importação e fixa por litro de combustível (ad rem) – para o hidratado. A expectativa é que senadores e deputados definam esta inclusão ainda em 2024. Sem esta inserção na monofasia, há maior facilidade para que empresas fictícias, mal-intencionadas, soneguem e possam constituir dividas ativas calculadas em dezenas de bilhões de reais. O etanol hidratado é alvo de ampla sonegação em todo território brasileiro, considerando que o tributo já possuía uma diferenciação ainda mais complexa do que os demais produtos, com recolhimento em 2 fases distintas da cadeia – produção e distribuição.

E, ainda, para reduzir a distorção de mercado no segmento, responsável por 9% do PIB Industrial brasileiro, autoridades e o setor privado precisam debater o programa Renovabio. Nos últimos três anos, cresceu o quantitativo de empresas que pararam de cumprir as metas, o que provoca uma concorrência desleal e predatória. Muitas fazem valer as punições do programa, que não têm efeito imediato. As obrigações acessórias do Renovabio devem ser cumpridas dentro do prazo estipulado, até para que todos trabalhem na mesma condição. Do contrário, algumas empresas não vão cumprir suas responsabilidades, outras postergarão e algumas nunca pagarão.

*CEO do Instituto Combustível Legal.

Fonte: Poder 360