Por Arnaldo Luiz Corrêa*
Num ambiente em que o cenário macroeconômico mundial aponta para um risco iminente de recessão nos EUA, em que a Bolsa Japonesa derreteu, acumulando uma queda de 10% em agosto, e em que a deterioração do conflito no Oriente Médio, com desdobramentos imprevisíveis, é uma ameaça constante; em que os resultados pífios nos balanços de grandes empresas americanas no mercado acionário, como a Microsoft, que despencou 12%, provocam a fuga dos investidores dos ativos de risco, atingindo as commodities e piorando o humor do mercado, parece não haver espaço para otimismo. E com o açúcar, não poderia ser diferente.
O contrato com vencimento em outubro/24 encerrou a semana cotado a 18.17 centavos de dólar por libra-peso, uma queda acumulada de 31 pontos (equivalentes a 6.83 reais por tonelada) em relação à semana anterior. Os demais vencimentos também tiveram quedas maiores nos contratos mais curtos e quedas menores nos contratos mais longos. Na média, uma queda de 10-15 pontos (3 dólares por tonelada).
A posição dos fundos, segundo o COT (Commitment Of Trades), relatório dos comitentes, publicado pelo CFTC (Commodity Futures Trading Commission), agência independente do governo dos Estados Unidos, que regula os mercados de futuros e opções das commodities, nesta sexta-feira com base na posição de terça-feira passada, indicava que eles estavam 40,500 lotes vendidos a descoberto.
Na nossa visão, a posição dos fundos dessa magnitude é vulnerável e vai depender de fatores exógenos de impacto que deem sustentação para que o mercado possa se mover na direção almejada pelos especuladores. Parece-nos que, neste momento, olhando os fundamentos do mercado de açúcar – e não os fatores externos – as notícias baixistas já estão devidamente precificadas. O cenário macro traz incertezas, sabemos disso. Por exemplo, o VIX (conhecido índice do medo) subiu 29% nesta sexta-feira.
Na semana que passou, o petróleo tipo WTI e Brent, além da gasolina e do óleo de aquecimento, caíram todos mais de 5%. Os estímulos chineses para a economia não surtiram nenhum resultado, aumentando as preocupações globais. O real continuou sofrendo frente ao dólar e desvalorizou um pouco mais nesta semana, encerrando a sexta-feira cotado a R$ 5,7000, após ter alcançado R$ 5,7935, a maior cotação desde março de 2021. O Banco Central do Brasil manteve os juros estáveis na reunião ocorrida na quarta-feira, mas disse estar atento a como o governo vai lidar com o déficit fiscal.
A espada na cabeça do mercado, como já comentamos aqui é o enorme volume de açúcar sendo exportado pelo Brasil inundando o mundo de açúcar. Agora, um novo recorde: 36.8 milhões de toneladas de açúcar no acumulado de doze meses (de julho/23 até junho/24), um acréscimo de quase 28% em relação ao mesmo período do ano passado. Se nos concentramos apenas nesse semestre, o País já mandou para fora 16.8 milhões de toneladas de açúcar, 49% acima do mesmo período do ano anterior.
Por outro lado, a possibilidade de a Índia exportar açúcar é muito pequena. E se ocorrer, não será antes de fevereiro/março do próximo ano. O preço justo e remunerador (FRP) foi ajustado em 8% em função do aumento do custo dos insumos agrícolas. Segundo um executivo que atua naquele país, “o cultivo da cana continua sendo a primeira escolha do agricultor comparativamente a outras culturas. Além disso, a cana tem um mercado garantido com compradores obrigados a pagar o FRP”. O FRP equivale a 17.75 centavos de dólar por libra-peso.
Um outro analista entende que “para não haver atrasos no pagamento do preço da cana no próximo ano, o preço do açúcar deveria estar em ₹41.000 por tonelada em Uttar Pradesh (UP) e cerca de ₹39.000 por tonelada em Maharashtra (MH)”. Isso equivale a 21 e 22 centavos de dólar por libra-peso, respectivamente. Nossa estimativa é que os preços da 25/26 está defasados 200 pontos e a 26/27 300 pontos, corroborando com o que pensa o citado analista.
Segundo nosso colaborador Marcelo Moreira, o contrato de outubro de 2024 de açúcar negociou na máxima da semana a 19.32 centavos de dólar por libra-peso, encerrando o dia a 18.10. Esse movimento foi influenciado pela desvalorização do real e pela queda do preço do petróleo WTI. O principal fator de estresse no mercado foi a divulgação dos dados econômicos dos EUA, que indicaram um risco de recessão a partir do segundo semestre. No curto prazo, o contrato de outubro de 2024 encontra suporte importante nas faixas de 17.75/17.46 e 16.50 centavos de dólar por libra-peso, com resistências em 18.54/19.11/19.71 centavos de dólar por libra-peso. O contrato de julho de 2025 fechou em cima do suporte crucial da banda de Bollinger dos últimos 50 dias, a 17.44 centavos de dólar por libra-peso. Os novos suportes estão em 17.04 e 16.62 centavos de dólar por libra-peso, enquanto as resistências encontram-se em 17.72, 18.37 e 18.89 centavos de dólar por libra-peso.
Nos últimos 20 anos, o menor volume mensal de contratos futuros de açúcar negociados na ICE (a bolsa de açúcar em NY) se concentrou, em 75% das vezes, no último trimestre do ano. Obviamente isso tem a ver com o final da safra de cana no Centro-Sul e o volume declinante da necessidade de hedge nesse período que antecede a safra seguinte. Até aqui nenhuma novidade. Fora desse intervalo, o período de férias no hemisfério norte (julho e agosto) também registra volume de negócios 20% inferior à média, podendo chegar algumas vezes a 30%.
Menor volume, com menos participantes abre espaço para maiores oscilações e maior volatilidade. E nós temos visto isso no mercado de açúcar nessas últimas semanas. O mercado tem dado sinais confusos prejudicados pelos ruídos internos e externos que tem afetado o câmbio e o comportamento errático dos fundos especulativos.
*Gestor de Risco para o mercado agrícola de commodities e sócio-diretor da Archer Consulting.
Fonte: Archer Consulting