Governo avança para incluir etanol dos EUA no RenovaBio, segundo reportagem da Exame

O governo brasileiro está próximo de autorizar que produtores de etanol dos Estados Unidos a participem do RenovaBio. Segundo reportagem da Exame, a mudança permitiria às empresas americanas gerar CBIOs (créditos de descarbonização), hoje restritos aos fabricantes nacionais.

O tema foi mencionado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, que afirmou, em vídeo enviado ao Encontro Empresarial BR-US 2025, da Amcham, que o “questionamento para importação de produtos americanos e biocombustíveis está praticamente resolvido”. Em seguida, Tatiana Prazeres, secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), detalhou as negociações.

Segundo ela, ajustes nas regras brasileiras foram feitos para “facilitar que empresas americanas tenham acesso ao programa”, atendendo a uma demanda antiga dos EUA.

Um debate histórico

A participação do etanol americano no mercado brasileiro é um dos principais pontos de tensão comercial entre os dois países. Em fevereiro, em meio à defesa de tarifas sobre produtos estrangeiros, o então presidente Donald Trump citou o etanol brasileiro como exemplo de “injustiça”, destacando que o Brasil impõe 18% de taxa sobre o etanol dos EUA, enquanto os americanos cobram 2,5% do produto brasileiro.

O que muda no RenovaBio

Criado em 2017, o RenovaBio é a principal política brasileira para reduzir emissões no setor de transportes. Produtores certificados podem emitir CBIOs conforme a eficiência energética e ambiental de suas usinas.

Hoje, apenas fabricantes nacionais podem gerar esses créditos. Mas, como explica Bruno Wanderley, da Datagro Consultoria, a própria lei do RenovaBio já prevê a certificação de biocombustível importado, falta apenas regulamentação específica.

Essa futura regulamentação deverá definir critérios como pegada de carbono, volume elegível e procedimentos técnicos para permitir que o etanol importado gere CBIOs.

Segundo Wanderley, o impacto inicial seria limitado, já que o CBIO está em torno de R$ 35. “O prêmio sobre o etanol importado seria de menos de 2 a 3 centavos por litro”, afirma. Para ele, um efeito realmente significativo viria da eventual redução da tarifa de importação.

Etanol dos EUA: exportações em alta

Mesmo com tarifa, os EUA devem exportar 650 milhões de litros ao Brasil na safra 2025/26, 160% mais que no ciclo anterior, segundo a Datagro. O aumento é impulsionado pela maior demanda gerada pela elevação da mistura obrigatória de etanol na gasolina, de 25% para 30%, e pela quebra na produção de etanol de cana.

Em 2024, as exportações globais americanas cresceram 34,8%, chegando a US$ 7,5 bilhões, 15º ano consecutivo de aumento.

Possível impacto no Nordeste

A eliminação da tarifa sobre o etanol dos EUA poderia provocar mudanças significativas no mercado. A Datagro avalia que o produto americano tende a ganhar espaço no Nordeste, região deficitária em oferta e onde ele chega de 12% a 15% mais barato que o nacional.

Nesse cenário, haveria pressão sobre os preços internos e redução da necessidade de transferências de etanol do Centro-Sul para o Norte-Nordeste, hoje cerca de 1 bilhão de litros ao ano.

A consultoria afirma que, se o Brasil ceder à pressão americana, o mercado nordestino pode ser “inundado” pelo etanol importado, afetando produtores de todo o país.

Atualmente, o Brasil recorre ao etanol americano principalmente em períodos de alta demanda, para garantir a mistura obrigatória de 30% de etanol anidro na gasolina.

Íntegra da matéria em Exame.