
do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) — Foto: Claudio Kbene/ PR
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou a empresários brasileiros durante a missão à Indonésia, nos últimos dias, que a prioridade na conversa que ele terá com Donald Trump neste domingo (26) será reverter a taxação adicional para a carne bovina e o café exportados aos Estados Unidos. Em troca, o Brasil pode reduzir a tarifa de 18% cobrada sobre a importação do etanol americano.
O encontro irá ocorrer em Kuala Lumpur, na Malásia. O horário ainda não está definido, mas fontes informaram à reportagem do Valor no país asiático que a reunião pode ser entre 17h e 18h no horário local (6h e 7h de Brasília).
“As expectativas são as melhores possíveis”, disse uma pessoa que acompanha a missão e conversou diretamente com Lula recentemente sobre os movimentos por desoneração nos EUA da carne bovina e do café. Segundo a fonte, a chance é grande de haver um encaminhamento concreto para solucionar o impasse bilateral.
A expectativa é de que os EUA retirem a tarifa adicional de 40% imposta desde agosto sobre os produtos brasileiros. A taxa de 10% estabelecida em abril para todos os países continuaria em vigor.
Não existe um formato definido para a eventual retirada das tarifas, se será imediata ou gradual, acrescentou a fonte. A decisão irá depender da conversa entre Lula e Trump, completou a fonte. Nenhuma decisão efetivamente deverá ser tomada no encontro, mas a reunião em si já é considerada um avanço pelos empresários de segmentos exportadores do agronegócio. A promessa de que seus produtos serão citados melhora a expectativa.
O presidente americano disse neste sábado (25/10) que poderá rever as tarifas impostas aos produtos brasileiros “diante das circunstâncias certas”. Lula afirmou que eles vão “colocar os problemas na mesa” e tentar “encontrar uma solução”.
Em troca da revisão do tarifaço, o Brasil deve ceder e indicar uma redução na alíquota de 18% cobrada sobre as importações de etanol americano. A medida gera preocupação aos produtores nordestinos do biocombustível, que são contra essa facilitação no comércio com os produtores dos EUA.
A melhoria nas condições para exportação de etanol esteve no topo das prioridades americanas desde o início das negociações com o Brasil na área agrícola. Recentemente, o Ministério da Agricultura e a diplomacia brasileira haviam recebido sinais de que o tema seria colocado sobre a mesa. Posteriormente, representantes das usinas brasileiras de etanol fizeram contato com o ministro Carlos Fávaro e enviaram ofício com pedidos ao governo para não ceder nessa área nas tratativas com Washington.
Outra pessoa a par do assunto avaliou que deve haver nova pressão dos EUA pela redução tarifária do etanol, mas ela acredita que o setor produtivo brasileiro será ouvido e consultado antes de o martelo ser batido na negociação.
Recentemente, a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica) e a Bioenergia Brasil negaram a existência de qualquer negociação com o governo federal para redução da tarifa de importação do etanol americano.
As entidades disseram que mantêm confiança na “condução responsável e equilibrada do governo federal nas discussões comerciais com os Estados Unidos” e reforçaram que qualquer debate sobre política tarifária deve preservar a “segurança energética, a estabilidade das regras e a credibilidade do Brasil como líder na transição energética de baixo carbono”.
Para o setor, o etanol brasileiro é um ativo estratégico de soberania nacional e não pode ser tratado como “moeda de troca em negociações comerciais”, diz a nota de 17 de outubro.
A tarifa de 18% é aplicada desde 2023, após um período de isenção. O Brasil condiciona a redução na taxa a uma expansão do acesso ao mercado de açúcar nos EUA, atualmente limitado a uma cota de 155 mil toneladas distribuída entre usinas do Nordeste ou a cobrança de alíquotas acima de 64% após o “tarifaço”.
Do lado brasileiro, há reclamações de que o etanol americano, produzido à base de milho, recebe subsídios e gera concorrência desleal com a produção nacional, ainda liderada pelo uso de cana-de-açúcar como matéria-prima. Por isso, as negociações vinculam qualquer recuo nas tarifas sobre o biocombustível à melhoria de acesso para o açúcar brasileiro. Brasileiros argumentam, também, que a cadeia nacional é mais sustentável.
Mesmo com as tarifas, os EUA exportaram 111,5 mil toneladas de etanol entre janeiro e setembro de 2025, com faturamento de US$ 68,4 milhões. Os números superam o desempenho de todo o ano passado, quando os americanos venderam 86,2 mil toneladas — negócios que renderam US$ 50,1 milhões.
Café e carne
Em setembro, o segundo mês com a vigência do “tarifaço”, os EUA reduziram em 52,8% as importações de café do Brasil na comparação com setembro de 2024, segundo o Conselhos dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Foram adquiridas 332,8 mil sacas do grão. Com isso, os americanos caíram para o terceiro lugar no ranking mensal de importadores.
Historicamente, o Brasil é o principal fornecedor de café dos EUA, com cerca de 30% do mercado. Em 2024, os produtores brasileiros exportaram 471 mil toneladas para os americanos, com faturamento superior a US$ 2 bilhões. Com a queda nas vendas por conta do “tarifaço”, os embarques para lá estão em 249,5 mil toneladas até setembro, com renda de US$ 1,6 bilhão. Ao todo, foram embarcadas 2,8 milhões de toneladas de café no ano passado a destinos do mundo todo.
Nesta semana, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, Geraldo Alckmin, confirmou a representantes do setor que o café estará na mesa de negociação de Lula e Trump e que existem duas estratégias: tentar uma suspensão imediata de todas as tarifas para o produto enquanto os governos trabalham para concluir um acordo comercial bilateral ou incluir o café na lista de isenção produto a produto, medida que pode garantir recuo, ao menos, da aplicação da tarifa adicional de 40%.
No caso da carne bovina, o Brasil estava ampliando as exportações gradualmente para os EUA, onde o produto nacional é usada como ingrediente para a fabricação de hambúrgueres, principal forma de consumo da proteína animal pela população americana. Em 2024, foram 229,5 mil toneladas. O ritmo estava mais acelerado em 2025, com 218 mil toneladas até agora.
Mesmo com retração nos embarques aos EUA nos dois meses de vigência do tarifaço (9,3 mil toneladas em agosto e 9,9 mil toneladas em setembro), as vendas continuam apoiadas na “competitividade do produto” nacional, diz a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec). No acumulado do ano, os embarques de carne bovina aos EUA aumentaram 64,6% em volume e 53,8% em valor em relação a 2024. (Colaborou Assis Moreira, de Kuala Lumpur, Malásia)
Por Rafael Walendorff
Fonte: Globo Rural