Guerra entre Israel e Irã eleva preços da ureia e preocupa os produtores

Foto: ABBINS

Por Isadora Camargo e Cibelle Bouça

A escalada da guerra entre Israel e Irã já afeta pelo menos um segmento do agronegócio. Os preços da ureia, principal fertilizante à base de nitrogênio usado na agricultura, tiveram valorização de quase 4% no mercado internacional desde o fim da semana passada, quando Israel iniciou os ataques à nação persa. Ontem, a matéria-prima fechou em alta de 1,01%, a US$ 399 por tonelada, segundo o Valor Data.

O conflito fez o insumo subir porque o Irã é um dos maiores produtores de ureia do mundo, com 9 milhões de toneladas em 2024, e exporta metade disso para diversos destinos, inclusive o Brasil. A ureia é um insumo básico para nutrição das plantas, usado principalmente nas lavouras de milho.

Na sexta-feira (13/6), data do primeiro bombardeio, as cotações do nitrogenado alcançaram US$ 395 a tonelada, uma alta de 2,66% em relação ao dia anterior.

Uma semana antes, o cenário no mercado do insumo era bem diferente. “No último dia 12 de junho, o mercado de nitrogenados estava com baixa liquidez, aguardando pelos desdobramentos de um leilão indiano de compra de ureia. O leilão ficou em segundo plano, em meio à escalada das tensões no Oriente Médio, com o preço médio subindo para US$ 430 por tonelada CFR Brasil, em 13 de junho”, detalha Renata Cardarelli, especialista em agricultura e fertilizantes da consultoria Argus. O preço CFR inclui o custo do produto acrescido do frete marítimo internacional.

Segundo a Argus — que acompanha cotações internacionais de variados insumos — ontem, o preço da ureia com frete incluído chegou a US$ 435 a tonelada.

O movimento é preocupante para o Brasil, que importa 100% da ureia utilizada na agricultura. Isso porque a alta do insumo pode significar aumento dos custos de produção para os agricultores.

Levantamento da Argus mostra que em 2024, o Irã forneceu o equivalente a 1,6 milhão de toneladas das 8,3 milhões de toneladas de ureia importadas pelo Brasil. O Oriente Médio como um todo é principal exportador global de ureia, embarcando cerca de 20 milhões de toneladas anuais.

“Portanto, qualquer desdobramento como esse no Oriente Médio pode impactar diretamente os custos de produção do produtor rural”, afirma o analista Jeferson Souza, da Agrinvest. A região também é estratégica no escoamento de fertilizantes, pois concentra o estreito de Ormuz, no Golfo Pérsico, uma das principais rotas de produtos como ureia e petróleo.

Apesar de a infraestrutura de produção de ureia no Irã não ter sido atingida por mísseis ou drones, fontes locais ligadas à Argus disseram que a paralisação parcial de algumas das sete unidades de produção no país seria uma medida preventiva.

As incertezas provocadas pelo conflito também devem levar a uma retração dos participantes no mercado físico, na avaliação da analista da Argus. Mais um fator de pressão sobre as cotações.

Para os agricultores brasileiros que ainda não adquiriram o adubo nitrogenado para a próxima safra 2025/26, o cenário é desfavorável, avalia a consultoria StoneX. Este é um período estratégico de planejamento de compras de insumos para o plantio da safra de verão — que começa em setembro —, e também para a antecipações de aquisição de fertilizantes para a safrinha de milho do próximo ciclo.

A preocupação não se limita ao fornecimento do insumo: há risco de atraso de mercadorias já adquiridas, que dependem da logística marítima para chegar a tempo do plantio. Além disso, se o petróleo continuar a se valorizando, os fretes marítimos podem ficar mais caros — o que também tende a pressionar os fretes rodoviários domésticos e os custos dos seguros das cargas, avalia a StoneX.

No primeiro dia do conflito, o barril de petróleo tipo Brent subiu 7,2%, mas ontem o contrato teve queda de 1,35%, para US$ 73,23, com os sinais de que poderia haver espaço para negociação entre Israel e Irã.

A cadeia de suprimentos global de fertilizantes já viveu um estresse semelhante em 2022, com o início da guerra entre Rússia e Ucrânia, lembra o analista de Inteligência de Mercado da StoneX, Tomás Pernías. No pico do conflito, a ureia chegou a custar mais de US$ 1 mil por tonelada. Além da possível alta dos fretes num cenário de petróleo mais caro, Pernías prevê também maior pressão sobre preços dos seguros de cargas.

Alerta para o milho

Outro mercado que entrou no radar dos analistas em função da guerra é o de milho, já que o Irã é o maior importador do cereal brasileiro. A avaliação inicial é de que as exportações brasileiras não devem sofrer interferência, pelo menos enquanto os portos iranianos permanecerem abertos.

O Brasil exportou 4,3 milhões de toneladas para o Irã em 2024, contra 3,2 milhões de toneladas em 2023, de acordo com dados do Agrostat, plataforma do Ministério da Agricultura. De janeiro a maio deste ano, os embarques de milho ao país somaram 2,19 milhões de toneladas, bem acima das 869,5 mil toneladas de igual período de 2024.

O consultor independente Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting, observa que “o Irã não compra milho americano e vai continuar comprando do Brasil porque precisa”.

Já Ronaldo Fernandes, da Royal Rural, é menos otimista. “O Irã vai continuar dependendo do milho brasileiro, mas uma coisa é ter necessidade e outra é conseguir comprar o produto”.

(Colaborou Paulo Santos, de Campina Grande -PB)

Fonte: Globo Rural