Por Jasmine Olga
O mercado de petróleo vive um momento de estresse. Uma guerra no Oriente Médio costuma ser sinal de pressão nos preços da commodity, com grandes riscos de uma disparada no valor do barril. E, embora nem sempre de forma 100% correlacionada, as ações da Petrobras (PETR3;PETR4) costumam ser impactadas por esse movimento.
Nos últimos quatro pregões, houve quatro altas para o barril Brent. Esse é o contrato futuro da commodity mais utilizado como referência global na definição de preços de combustíveis e outros derivados do petróleo.
O maior dos ganhos ocorreu na última segunda-feira (30), refletindo uma piora na tensão no Oriente Médio — alta de 3,85%, o maior avanço diário desde 16 de novembro de 2023.
O movimento acontece na esteira de uma intensificação da tensão na região. Israel está em confronto armado contra o Irã, o Líbano, a Faixa de Gaza e a Síria.
Bola de neve
Essa é uma evolução de um quadro que se arrasta desde outubro de 2023, quando Israel retaliou uma ação terrorista do grupo Hamas, que controla o governo da Faixa de Gaza. Desde então, mais de 41 mil vidas foram perdidas.
Com países como Arábia Saudita, Irã, Iraque, Emirados Árabes Unidos e Kuwait, o Oriente Médio é responsável por cerca de 31% de toda a produção global. Cada fagulha de tensão por lá é capaz de causar um efeito dominó nos mercados globais.
Ainda é cedo para dizer até onde o novo conflito poderá chegar. No caso de uma guerra generalizada na região, a preocupação é que o preço do barril volte a ultrapassar a casa dos US$ 100 (R$ 550).
A situação pode ser favorável para a geração de receita de muitas petroleiras, mas pode desencadear uma onda inflacionária global, obrigando boa parte dos bancos centrais a retomar os seus ciclos de alta de juros. Com isso, as economias desaceleram, o custo de capital aumenta, as bolsas de valores enfrentam uma fuga de investidores e o consumo é desincentivado.
Crise: 5 vezes que o barril de petróleo disparou
Essa não é a primeira nem a última vez que o barril de petróleo acelera e gera temor nos mercados globais. Às vezes as razões são geopolíticas, com guerras gerando dúvidas sobre o volume da produção. Outras vezes, são causadas por uma aceleração global mais rápida do que o esperado. Há ainda conflitos de preço entre países produtores e interferência da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep).
Os primeiros registros históricos do preço do Brent começaram a ser feitos na década de 1970, mas os bancos de dados mais amplos remontam a 1987. Foi nesse período que os contratos futuros da commodity começaram a ser negociados, facilitando o registro.
Com base em um levantamento feito pela Quantum Finance a pedido da Forbes Brasil, confira alguns dos eventos que mais pressionaram o preço do petróleo para cima na história — do mais recente ao mais antigo.
1 – Invasão da Ucrânia pela Rússia
Uma das crises mais recentes no preço do barril do petróleo ocorreu após a Rússia cumprir a sua ameaça de invasão da Ucrânia. Foram meses de flerte com a guerra, o que gerou pressão no Brent antes mesmo do movimento bélico ser confirmado.
A guerra teve início em 24 de fevereiro de 2022. Entre dezembro de 2021 e maio de 2022, o preço do barril disparou 58,13%. O maior movimento foi em janeiro, no pré-guerra, com um avanço de 18,36% em apenas 30 dias. O preço do barril chegou a atingir a marca de US$ 139,13 (R$ 751, no câmbio atual), um dos patamares mais altos desde a crise econômica de 2008. Com a tensão se iniciando em 2021 e a invasão ocorrendo em 2022, o barril disparou 111,3% em dois anos.
2- Pandemia da COVID-19
A pandemia do coronavírus, que começou em 2020, teve um impacto em diversos mercados. O de commodities energéticas não foi uma exceção. Com os países fechando suas fronteiras, fábricas e o isolamento social obrigatório, a perspectiva de uma queda brusca na demanda fez com que o Brent despencasse 54,25% em março de 2020.
A recuperação, no entanto, foi rápida. De maio a agosto, a commodity subiu 103,75%. O maior avanço foi em maio, quando o barril avançou 84,97%. Uma série de razões ajuda a explicar o movimento.
A Opep e seus aliados (Opep+) realizaram uma operação emergencial com cortes profundos na produção para segurar os preços. Em abril, a entidade fez o maior corte da sua história — menos 9,7 milhões de barris por dia (bpd). Na época, essa quantidade representava 10% da oferta mundial de petróleo.
Países fora da Opep também reduziram a sua produção de forma voluntária. Além disso, muitos aumentaram suas reservas, comprando parte da oferta não consumida em um período de fraca demanda.
3- Crise econômica de 2008
A crise financeira de 2008 foi uma das mais severas crises econômicas desde a Grande Depressão, em 1929. O primeiro a sentir o efeito o baque foi os Estados Unidos, com o colapso do mercado imobiliário que, nos anos anteriores, havia incentivado empréstimos hipotecários de alto risco e práticas de concessão de crédito irresponsáveis.
A disparada nos preços veio em duas ondas: imediatamente após o início da crise — nos meses antecedentes à quebra do Lehman Brothers — e em 2009, quando a recuperação econômica global começou. A falência do banco, que virou símbolo do período, ocorreu em setembro de 2008. De abril a junho, a alta no preço do barril foi de 46%. O recorde no valor do Brent é dessa época: US$ 147 (R$ 793).
Com a desaceleração econômica global, o petróleo amargou sete meses consecutivos de perdas robustas, até que os incentivos financeiros e monetários em larga escala começassem a fazer efeito. A Opep também interferiu, fazendo cortes na produção. É daí que veio a segunda parte da valorização: de fevereiro de 2009 a junho do mesmo ano, o avanço foi de 56,66%.
4- Guerra de preços da Opep
De janeiro de 1999 a dezembro de 2000, o preço do barril de petróleo subiu 100,3% — 40% em 1999 e 60% em 2000. O período foi marcado por diversos eventos que impactaram a oferta e a demanda global. O denominador comum foi uma grave crise financeira nos então chamados Tigres Asiáticos — compostos por Cingapura, Coreia do Sul, Hong Kong e Taiwan, países com um crescimento acelerado nos anos anteriores.
Com a desaceleração da economia no continente, a Opep decidiu cortar a produção diversas vezes entre 1998 e 1999, dando sobrevida ao preço do barril e gerando um estoque mundial historicamente baixo. Além disso, o biênio também coincide com o aquecimento econômico global pós-crise, aumentando a demanda por petróleo.
5- Guerra do Golfo (1990-1991)
A Guerra do Golfo, no início da década de 1990, foi um dos primeiros grandes choques no preço do petróleo desde que os registros do Brent ficaram mais precisos. A invasão do Kuwait, promovida pelo Iraque de Saddam Hussein, levou o globo a um grande temor de interrupção no fornecimento da commodity.
Na máxima, o preço do barril atingiu a marca de US$ 41,90 em outubro de 1990 — alta de 229% desde o fechamento de 1989. Naquele ano, o barril encerrou dezembro com um avanço de 30% em 12 meses.
O petróleo foi a principal razão para a guerra. Hussein afirmava que o Kuwait estava excedendo sua oferta. Em 1991, quando o inimigo do Iraque recebeu ajuda dos Estados Unidos, as forças iraquianas incendiaram cerca de 600 campos de petróleo do Kuwait.
Como fica a Petrobras?
Na teoria, preços mais altos do barril de petróleo significam perspectivas mais positivas para petroleiras como a Petrobras. Isso ocorre porque, quando o Brent avança, é possível vender a sua produção por um valor mais alto, sem necessariamente ter um aumento de custo. Mais receita e gastos estáveis se refletem em mais lucro, o que costuma resultar em um avanço significativo no preço das ações dessas companhias.
No entanto, a história é um pouco mais complexa e a correlação entre o preço do petróleo e as ações da Petrobras não é exatamente parelha.
Com exceção do forte avanço visto em 2020 e 2008, os picos de alta expressiva da estatal brasileira raramente coincidem com recordes de valorização do Brent. Isso não significa que ela não se beneficia desses movimentos, apenas que há outros fatores limitantes que entram na conta.
Política de preços e confiança
Desde o início da década de 2000, é frequente que interferências do governo na política de preços de combustíveis, na gestão e o envolvimento da companhia em escândalos políticos tenham limitado o impacto de alguns ciclos de alta da commodity.
No pós-Covid, a empresa surfou a alta do petróleo muito por sua política de preço, que repassava todos os aumentos e quedas
Desde o início do governo Lula, a história é outra. Em maio de 2023, a estatal deixou de utilizar a política de preço de paridade de importação (PPI), instituída em 2016, e passou a levar outros fatores para a elaboração do valor a ser cobrado pelos combustíveis.
Devido a regras pouco claras e o potencial de perda de receita em momentos de alta do preço do barril, o mercado fica com dúvidas e acaba penalizando a companhia.
Fonte: Forbes