Políticas de carbono transformarão mercado de biocombustíveis até 2030

Por Nayara Machado

Nos próximos cinco anos, quase 40% da demanda de combustível para transporte rodoviário será coberta por políticas que incentivam a redução do carbono ao longo do ciclo de vida, marcando uma mudança em relação às tradicionais exigências de mistura volumétrica de biocombustíveis.

A conclusão é de um estudo encomendado pela presidência brasileira do G20 à Agência Internacional de Energia (IEA, em inglês) para subsidiar o debate internacional sobre o papel dos biocombustíveis na transição energética.

Na presidência rotativa do G20 este ano, o governo brasileiro tem defendido sua bioenergia como uma alternativa sustentável, capaz de concorrer com a eletrificação, especialmente em mercados do Sul global.

Para comprovar essa sustentabilidade – e enfrentar resistência de ambientalistas e europeus – a estratégia é avançar com certificações que considerem as diferenças regionais na hora de avaliar o ciclo de vida de carbono.

Será importante para concorrer com a eletrificação na frota rodoviária, prevista para aumentar, em média 21% ao ano, até 2030, mas também para abrir mercados para os biocombustíveis avançados que abastecerão aviões e navios no futuro próximo.

Estes dois últimos setores, altamente dependente de combustíveis fósseis e responsáveis por cerca de 3% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE), cada, prometem um salto na demanda por derivados de biomassa e resíduos.

“O benefício climático dos biocombustíveis depende em grande parte da intensidade de carbono de sua produção. Assim, serão necessários marcos regulatórios sólidos apoiados por cálculos de intensidade de carbono transparentes e baseados na ciência para atrair os investimentos necessários para aumentar a produção de biocombustíveis”, resume a Plataforma Biofuturo ao divulgar o estudo (.pdf).

Uma das dificuldades na formulação dessas políticas, aponta, é o uso da contabilidade de carbono, dadas as contradições nos relatos sobre os resultados de emissões de GEE e a falta de consenso entre as metodologias.

Algo que, mesmo com a construção de consensos, só reduzirá parcialmente as variações nos resultados. Ainda assim, os analistas defendem que os formuladores de políticas tomem “decisões para contabilizar essa ambiguidade da maneira mais pragmática e eficaz possível”.

“Também será importante que as políticas promovam melhorias contínuas na sustentabilidade dos biocombustíveis, e que as metodologias de análise e verificação sejam projetadas e implementadas de acordo”.

As diferenças

Políticas para biocombustíveis que incentivam a redução de emissões no ciclo de vida já estão em andamento. No Brasil, o RenovaBio remunera os produtores pela eficiência energético-ambiental com créditos de descarbonização conhecidos como CBIOs.

Nos EUA, programas como o LCFS (Low Carbon Fuel Standard) da Califórnia estabelecem um teto de intensidade de carbono e os biocombustíveis que ficam abaixo dele geram créditos que podem ser vendidos para produtores de combustíveis que extrapolam o teto.

Embora haja um reconhecimento de que é preciso incluir questões sociais e ambientais na abordagem das contribuições dos biocombustíveis, hoje, a contabilidade de carbono geralmente considera apenas as emissões de GEE, o que por si só já gera divergências.

Isso porque o cálculo é influenciado por vários parâmetros relacionados a características técnicas e condições locais da cadeia de suprimentos, como o cultivo e/ou coleta de matérias-primas, aprimoramento das matérias-primas e o processo de conversão da biomassa em biocombustível. Também entra na conta o transporte: se caminhão, trem ou navio.

“As emissões de CO2 da combustão de biocombustíveis são consideradas neutras em carbono, pois o carbono na biomassa é produzido através da fotossíntese, que fixa CO2 da atmosfera e o transforma em biomassa”, explica o estudo.

“No entanto, quando os biocombustíveis são produzidos a partir de matérias-primas agrícolas, parâmetros importantes a serem considerados são as emissões associadas à produção e aplicação de fertilizantes nitrogenados sintéticos, bem como as emissões resultantes de mudanças nos estoques de carbono do solo devido a mudanças no uso da terra (LUCs) ou práticas agrícolas específicas”, completa.

Um exemplo é o etanol de milho. As emissões gerais de GEE são de 34 gCO2-eq/MJ para o renovável produzido nos Estados Unidos, em comparação com 37 gCO2-eq/MJ na União Europeia.

“É importante notar que as diferenças regionais são reais, e é importante contabilizá-las corretamente. As metodologias devem permitir o uso de dados e caminhos que sejam representativos das características de cada país ou região”, defende.

Prioridades políticas

Estabelecer políticas que recompensem o melhor desempenho de GEE e priorizar medidas de apoio à eficiência energética, captura de metano, melhoria no design de plantas de biogás/biometano e remoção de CO2 através de práticas agrícolas ou novos processos industriais, como captura e armazenamento de CO2 biogênico (BECCS, em inglês) são algumas das sugestões para serem incorporadas na agenda do G20.

A lista inclui melhorias nos estoques de carbono do solo, produção e uso mais sustentáveis de fertilizantes e BECCS para produção de e-combustíveis, além de abordar preocupações de mudanças indiretas no uso da terra a partir dos riscos de curto prazo e buscar desenvolver políticas globais de uso da terra.

Fonte: EPBR